Preparar-se individualmente e como sociedade para viver tanto, exige esforço, políticas adequadas e até uma ressignificação da vida.
Preparar-se individualmente e como sociedade para viver tanto, exige esforço, políticas adequadas e até uma ressignificação da vida.| Foto: Bigstock

A população brasileira está envelhecendo. De acordo com o Ministério da Saúde em 2030 o número de idosos ultrapassará o total de crianças e segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), agora em 2021, pessoas com mais de 65 anos totalizam 14,67% dos brasileiros. E assim como ano após ano aumenta a expectativa de vida de quem nasce no país, da mesma maneira crescem também as preocupações dos especialistas no assunto.

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“É extraordinariamente rápido o envelhecimento”, analisa o médico Alexandre Kalache, presidente do Centro Internacional de Longevidade Brasil e estudioso do envelhecimento. Ele chama esse processo de revolução da longevidade. “Porque a base da pirâmide demográfica está encolhendo de uma forma sem precedente”, explica.

A expectativa de vida em 2060 pode chegar a 81 anos, pela análise do IBGE. Só que se preparar individualmente e como sociedade para viver tanto, exige esforço, políticas adequadas e até uma ressignificação da vida, na opinião de Kalache. “Em um país com muita desigualdade há pessoas com 50 anos já envelhecidas e outras que chegam aos 90 muito bem”, diz. E para refletir sobre esse assunto, ele media debates com palestrantes da Organização Mundial da Saúde e Nações Unidas, por exemplo.

Desafios de um país que envelhece

Saúde, seguridade social, oportunidades de trabalho, nutrição e meio ambiente são áreas fortemente impactadas pelo envelhecimento populacional, conforme ressalta Kalache. “Tem que rever todas as políticas face a essa revolução”, argumenta. E completa: “Quando eu era estudante de medicina não havia nem a cadeira da disciplina de geriatria. O país era visto como um país jovem”. Ele lembra que em 1975 as mulheres brasileiras tinham, em média, 6 filhos. Já nos anos 2000, esse número caiu para menos de 2.

Além de questões práticas envolvendo a população acima de 60 anos, que exigem ações por parte dos governantes e implementação de políticas públicas específicas, o preconceito ainda é forte e um grande problema. A psicóloga especialista em idosos, Regina Célia Celebrone, afirma que a sociedade de hoje valoriza muito o que é novo. “É como se o que é velho estivesse pronto para ser jogado no lixo”, alerta.

Aceitar a idade

É por isso que, na opinião da psicóloga, muitas pessoas têm dificuldade para aceitar o próprio envelhecimento. “Existe todo um preconceito social contra o velho porque ninguém quer ficar velho. As marcas de velhice que eu vejo no outro são abomináveis porque sou eu amanhã”, aponta ela.

A psicóloga clínica Dayane Leite afirma que o envelhecimento é um período marcado por profundas transformações e que o declínio físico leva a alterações sociais e psicológicas. “Há situações que os idosos se excluem das atividades sociais, alegando a idade como pretexto, acreditando não serem mais capazes de realizar”, comenta.

Alexandre Kalache também destaca a cultura da juventude eterna do Brasil. “Você tem que ser belo para sempre, 'sarado', não pode ter uma gordurinha”, enfatiza. Ele constata que essa tirania em busca de uma perfeição que não existe é ainda mais cruel para as mulheres. Aceitar que o tempo passa para todos é o pontapé inicial para começar a reverter esse tipo de pensamento. “Para ter coragem de envelhecer vai ter que aguentar as perdas de uma vida. Perda de colágeno na pele, da mobilidade”, exemplifica Regina Célia.

Como começar a resolver o preconceito

Os três especialistas ouvidos pelo Sempre Família fizeram questão de frisar que a convivência entre pessoas mais velhas e mais jovens é a principal ferramenta para evoluir nesse aspecto. “Eu cresci rodeado de velhos. Minha avó tinha 13 irmãos, meu avô tinha 17. Sempre tive fascínio por pessoas mais velhas”, conta Kalache. E diz, ainda: “Não há forma de ter profissionais que respondam bem ao envelhecimento, sejam cuidadores, médicos, arquitetos, do que ter convívio com pessoas idosas. Eles vão aprender a respeitar a voz, opiniões e protagonismo. Caso contrário você vai rechaça-los e ter preconceitos”.

Regina Célia viveu isso, na prática, com alunos de graduação. Ela coordenou um laboratório na Universidade Federal do Paraná, em que os alunos de psicologia frequentavam grupos de atividades com pessoas que tinham mais de 60 anos. “Não era incomum alunas falarem que não queriam ficar velhas”, lembra. Só que ao conviver com os idosos os alunos perceberam que muito mais do que envelhecer, essa fase da vida é uma experiência e começaram a admirar e respeitar mais os mais velhos.

Dayane também defende que esse vínculo, especialmente familiar, entre avós e netos, por exemplo, é um bom remédio para afastar sintomas da depressão. “Além da experiência da relação de troca, permitindo uma conexão com uma geração mais nova, dando abertura para novos conhecimentos”, conclui.

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