A atitude da pessoa controladora vai precisamente na contramão do que um relacionamento, de qualquer tipo, se pretende ser.
A atitude da pessoa controladora vai precisamente na contramão do que um relacionamento, de qualquer tipo, se pretende ser.| Foto: Heather Mount/Unsplash

A família é um tesouro, mas não está isenta de problemas que podem afetar muito a vida de todos os envolvidos. E um dos mais comuns é a atitude controladora que alguns membros podem exercer sobre os outros. Quer nos relacionamentos conjugais, quer entre pais e filhos ou em outros contextos, lidar com uma pessoa controladora não é nada fácil. As tensões que se criam podem ser uma bomba prestes a estourar a qualquer momento.

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“Uma pessoa controladora fica decepcionada ou frustrada se o outro corta o cabelo de uma forma que a desagrada, veste uma roupa que ela considera inadequada ou tem amigos com os quais não concorda”, diz a psicóloga Tatiana Festi. “Há uma supervigilância em relação à organização da casa, à rotina, às redes sociais, etc. Quando a pessoa sente que o outro não está sob seu controle, gera-se uma ansiedade muito intensa. E então essa ilusão de controle serve muitas vezes para aplacar essa ansiedade”.

Para a também psicóloga Lariza Monteiro, a tendência ao controle vai precisamente na contramão do que um relacionamento, de qualquer tipo, se pretende ser. “Precisamos entender que os relacionamentos são compartilhados: são pessoas que compartilham suas vidas e constroem a partir disso. Entendendo isso, é importante ressaltar que nem sempre temos controle sobre as situações e muito menos sobre as pessoas”, comenta ela.

Conexão genuína

Segundo Tatiana, um vínculo real com o outro exige que a preocupação com ele saiba incluir o respeito à sua liberdade como elemento fundamental. “A preocupação genuína pelo outro envolve a empatia. Ela permite que o outro tenha a liberdade de ser quem é. Há o desejo de que o outro possa se realizar independentemente da expectativa que eu tenha a respeito dele”, explica a psicóloga. “Quando entramos no domínio do controle, deixamos esse lugar de empatia e liberdade. A pessoa tem então uma grande dificuldade de lidar com a autonomia do outro – do outro sendo o outro, e não somente uma extensão dela mesma”.

“Vejo muitos conflitos de interesse atingirem os relacionamentos sociais. É necessário compreender a conexão que se tem com cada pessoa e aprimorar esses laços afetivos”, corrobora Lariza. “Num relacionamento de qualquer tipo, o que se reúnem são duas cargas emocionais e dois estilos de vida diferentes, e entender isso é fundamental para o bom convívio”.

O que leva alguém, entretanto, a se tornar uma pessoa controladora? “Não há uma única causa que leva a esse comportamento. Para cada pessoa, há uma origem diferente”, explica Tatiana, que elenca como algumas hipóteses situações de negligência, de trauma, de insegurança, ou ainda traços marcadamente mais sádicos.

“Por exemplo, um adulto que na infância vivenciou muitas negligências, teve uma experiência em que faltou muito o cuidado, sobretudo o de ordem afetiva, e assim viveu a necessidade de dar conta de muitas coisas sozinho. Essa pessoa se habituou a estar no controle das coisas, porque aquilo que foge do controle pode levar a sentimentos de angústia que já foram experimentados antes”, indica a psicóloga.

O que fazer

Precisamente por essa diversidade de razões, o caminho do autoconhecimento é fundamental para que a pessoa controladora que reconhece o seu comportamento possa deixa-lo para trás. “É importante cuidar desses traços, tendências, feridas ou tramas, para que a pessoa possa se sentir razoavelmente segura para abandonar essa necessidade de controlar o outro”, esclarece Tatiana.

Já a pessoa que se percebe controlada ou constrangida precisa buscar em primeiro lugar uma comunicação clara sobre a questão. “Quando se percebe essa problemática aflorada, é necessário o diálogo para restabelecer os espaços individuais e reconectar a pessoa a um relacionamento coparticipativo, em vez de abusivo”, diz Lariza.

“Isso não vai surtir um efeito imediato positivo”, antecipa Tatiana. “Muito provavelmente a pessoa controladora vai explodir, vai ficar nervosa. Não raro ela pode ir pelo caminho de uma chantagem emocional, começando a chorar ou virando o jogo e despejar acusações sobre o outro. Mas esses limites são necessários, para que a pessoa que está sendo controlada tenha espaço de existir nesse relacionamento”. A tarefa, no entanto, vai além do diálogo.

“Em paralelo a essa comunicação, é importante a pessoa que se sente controlada entender por que está em uma relação como essa, num trabalho de autoconhecimento”, indica a psicóloga, que afirma que a terapia de casal ou familiar pode trazer bons resultados se os envolvidos estiverem dispostos a reconfigurar a relação. Contudo, quando a pessoa controladora não dá nenhum indício de flexibilidade ou de querer buscar ajuda, o melhor caminho talvez seja o afastamento, já o que está em jogo é a própria possibilidade de ser quem se é.

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