Empoderamento feminino: como toda palavra nova que cai no gosto popular, esta se perdeu em discursos superficiais de celebridades.
Empoderamento feminino: como toda palavra nova que cai no gosto popular, esta se perdeu em discursos superficiais de celebridades.| Foto: Edward Cisneros/Unsplash

Muito se fala sobre empoderamento feminino. Como toda palavra nova que cai no gosto popular, esta se perdeu em discursos superficiais de celebridades. Banalizada em demonstrações de soberania de gênero, se tornou uma bandeira chata de convencimento sobre o “poder” da mulher. Periga virar barreira entre gêneros em vez de apoio à ideia de “poder” feminino. 

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Esta necessidade de autoafirmação me incomoda. Discursos feministas me soam chatos e ultrapassados. Vivemos em uma era de liberdade e inúmeras possibilidades para todos, independentemente do gênero. A invenção da pílula e tantos outros fatos históricos na verdade contribuíram para a igualdade de direitos vividas hoje... ainda que não totalmente perfeita, nos ajudaram a avançar na igualdade de direitos dos homens. 

A expressão empoderamento feminino passou a ser repetida sem conhecimento de causa para se tornar mais uma atitude “politicamente correta”. O tom feminista da palavra a meu ver, no entanto, traz um quê de recalque em que a frase do “eu tenho o poder” funciona como mantra de autoafirmação. 

Como papagaios, celebridades fazem discursos femi(ni)stas incitadas pela necessidade de se autoafirmarem como mulher poderosa. A igualdade de direitos conquistada décadas atrás agora precisa conscientizar mulheres sobre seu “poder”. Sério isso? 

Viver o mundo atual já exige da mulher força – e coragem – de lidar com os deveres (e as consequências) da igualdade de direitos conquistada. Portanto, não preciso de palavras politicamente corretas para provar nada a ninguém. Vivo o dia a dia que, por si só, me põe à prova diariamente.

Empoderamento feminino e as consequências 

“Empoderamento feminino é o ato de tomar poder sobre si”, segundo Julia Assis, do Impact Hub Curitiba. Em miúdos, promove a conscientização do poder, no caso, da mulher; tenta “acordá-la” para o poder que ela não sabe que tem graças à equidade conquistada com o feminismo. Entende mais assim? 

Usufruí da independência, autonomia e igualdade de gêneros promovida pelo feminismo. A revolução feminina ocorrida há anos nos trouxe aos dias de hoje: ao acesso à faculdade,  à liberdade de escolha de uma profissão, à construção de uma carreira, ao mercado de trabalho. 

Neste pacote de conquistas também veio a concorrência por uma vaga na faculdade, no trabalho, na vida. A conquista da igualdade (e do poder), portanto, trouxe consequências...  tanto boas quanto nem tão boas assim.

O bônus e o ônus 

A expressão bonita de um conceito pouco esclarecido e politicamente correto são estratégias de uma propaganda enganosa. Para fugir da cilada da manipulação é preciso desenvolver senso crítico para questionar, avaliar e, se for o caso, aderir à causa, mas de forma consciente em vez de uma ideia vaga e atraente à massa inconsciente. 

O empoderamento da expressão – perdoe-me o trocadilho – como bandeira de soberania feminina (femismo), definitivamente, não me atrai. Herdamos do movimento feminista o direito de conduzir a própria vida escolhendo trabalho, parceiro, religião, educação. Ampliamos nossas possibilidades enormemente; conquistamos o direito de ocupar cargos até então dominados por homens; de optar por caminhos pessoais diferentes do padrão “casar e ter filhos”. 

Se de um lado, os direitos abriram inúmeras possibilidades para a mulher de outro, trouxeram deveres e consequências igualmente pesadas e que parecemos esquecer ou, pelo menos, considerar. A todo bônus, o ônus e disso, ninguém fala – ou quer falar.

Por uma nação empoderada 

A necessidade de autoafirmação do poder feminino me parece mais femismo. Permitimos que palavras bonitas nos incitem a lutar por algo que não domino e, às vezes, nem desejo. Digo isso porque não me sinto necessitada a provar meu poder a ninguém: ele me é exigido involuntariamente em meio às inúmeras (e iguais) responsabilidades assumidas desde a dita revolução. 

Não preciso me provar “a poderosa”. Vivo e aprimoro meu poder de aguentar o tranco das consequências da equidade feminina diariamente. A visão unilateral da conquista disfarçou o fraco senso crítico de avaliar suas consequências que hoje se refletem no crescente número de mulheres estressadas e deprimidas com suas rotinas estafantes; obesas por não terem tempo nem energia para cuidar da saúde; filhos descuidados, maridos insatisfeitos, casamentos desfeitos. 

Sou fruto do feminismo e não preciso mostrar meu poder sob uma bandeira da soberania. Quero mais é incitar o empoderamento ao senso crítico, independente de gênero; quero ser capaz de unir forças em prol de indivíduos conscientes de que juntos somos mais fortes. Desejo não mulheres, mas uma nação empoderada.

O verdadeiro poder 

O “politicamente correto” virou necessidade de um mundo dito liberal. Enquanto isso, uma nação desprovida de senso crítico se torna vulnerável a discursos de papagaio que repete palavras mas não muda nada. Uma nação carente de liderança inspiradora e de educação, sabemos, mas parecemos não combater, está fadada a manipulações deste tipo. 

Pregar empoderamento (ou qualquer outra coisa) exige antes escutar diferentes opiniões e lados, avaliar, ponderar, argumentar, conhecer... e discernir. Antes de repetir palavras bonitas, avaliemos também as consequências de uma ideia “nova”.

O verdadeiro poder não é ter que se provar: é saber enxergar e analisar possibilidades, avaliar riscos e consequências; é pensar, escolher suas bandeiras conscientemente. Feita a escolha, também sustentar as consequências... as boas e não tão boas, fazem parte do pacote imperfeito de qualquer opção. Como mulher, profissional e mãe de adolescentes homens, usufruo dos benefícios da igualdade de gênero, mas também sinto na pele – e nos ombros – o peso dos direitos adquiridos. Este sim é o meu poder e o vivo todo dia ensinando filhos que não preciso me provar a ninguém, mas ser capaz de unir forças para efetivamente contribuir com uma sociedade melhor.

*Xila Damian é escritora, palestrante e criadora do blog Minha mãe é um saco!, espaço em que conta as situações cotidianas e comuns que vive sendo mãe de adolescentes, buscando desmistificar clichês sobre essa fase dos filhos, para transformá-la em um tempo de aprendizado.

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