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Enquanto buscava latinhas e peças de ferro danificadas que pudesse negociar em ferros-velhos da cidade, o mineiro Verotides Jorge Teixeira, de 54 anos, presenciou uma cena que o marcou para sempre. “Vi um menino se arrastando pelo chão com as pernas enroladas em um cobertor porque não tinha uma cadeira de rodas, e aquilo me tocou”, recorda o morador de Conselheiro Lafaiete, interior de Minas Gerais.

Na mesma semana, o homem reuniu suas economias, comprou o equipamento que o garoto precisava e entregou de presente à família da criança. Só que, mesmo após a doação, não esquecia a imagem do pequeno e pensava em outras pessoas com a mesma necessidade que não tinham condições para pagar mais de mil reais por um item como aquele. “Foi aí que lembrei de algumas cadeiras de locomoção destruídas que vinham no meio da sucata e decidi fazer a reforma delas de graça”, conta o voluntário, que até transformou a laje de sua casa em uma oficina para realizar o trabalho.

Projeto possibilita que pessoas com deficiência física andem de bicicleta

A ação começou em junho de 2018 e já atendeu quase 100 pessoas como o jovem Carlos Henrique dos Santos, de 26 anos. Vítima de um disparo de arma de fogo durante a adolescência, o rapaz ficou paraplégico e passou a movimentar-se com o auxílio de uma cadeira de rodas. “Só que ela quebrou há alguns dias e eu não tinha como adquirir outra”, relata o rapaz. “Aí foi só ligar para o ‘Seu Tide’ que ele já me ajudou”, completa ao citar o apelido pelo qual o vendedor de ferro velho é conhecido na região.

Com a mesma rapidez, Teixeira também atendeu na última semana à solicitação do aposentado por invalidez Anderson Luiz Resende, que sofre de distrofia muscular degenerativa e precisou de uma cadeira de banho. “Recebo só um salário mínimo e gasto muito com remédios, então o procurei logo que minha cadeira quebrou”, relatou o mineiro de 40 anos, de Conselheiro Lafaiete. “Ele me atendeu bem rápido e isso me ajudou muito”.

No entanto, de acordo com Verotides, nem sempre é possível contemplar todo pedido, devido à sua situação financeira e ao pouco tempo que tem disponível para o trabalho voluntário. “Faço as reformas sozinho e, como compro e vendo sucata a semana inteira para pagar minhas contas, só consigo mexer nas cadeiras sábado e domingo”. Além disso, as restaurações exigem investimento em peças, ferramentas e diversos produtos usados no processo. “Nesta quarta-feira (9), por exemplo, comprei material para fazer 22 forros de assentos e encostos, e já mandei para uma estofaria preparar”.

“Passo apuro financeiro e estou com duas prestações atrasadas do meu caminhão. Só que não consigo ver uma pessoa precisando e não fazer nada”, revela.

Essa e outras empresas da cidade, segundo ele, até reduzem o valor da mão de obra para ajudar o projeto, mas o valor de custo precisa ser pago e sempre ultrapassa seu orçamento. “Também coloco combustível no caminhão para buscar cadeiras velhas que recebo, levo as reformadas na casa do cadeirante, e gasto bastante água e luz usando compressor e outros equipamentos”, relata o comerciante, que destina mais dinheiro à ação social do que poderia, mas não se arrepende. “Passo ‘apuro’ financeiro e estou com duas prestações atrasadas do meu caminhão. Só que não consigo ver uma pessoa precisando e não fazer nada”, revela.

Como ajudar?

Foto: Arquivo pessoal/Verotides Jorge Teixeira Foto: Arquivo pessoal/Verotides Jorge Teixeira

Por isso, ele e a irmã Janaína Teixeira Ribeiro começaram a postar fotos e vídeos do trabalho nas redes sociais na tentativa de conseguir patrocínio. “Pedimos materiais para as reformas e estamos em busca de doações para a construção de um galpão onde possamos colocar as cadeiras”, explica a entregadora de 45 anos. De acordo com Tide, atualmente ele conta com quase 60 equipamentos danificados em seu pátio, mas precisa de um espaço coberto para protegê-los enquanto não consegue reformar todos.

Alguns voluntários, inclusive, já entraram em contato para colaborar com doações, mas a ajuda ainda é pequena e o número de solicitações realizadas por cadeirantes não para de crescer. “Estou com três pedidos para atender aqui na região e não tenho cadeiras prontas”, lamenta. “Sem contar os contatos que recebemos de cadeirantes do Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul e de outros estados que não temos condição de ajudar”.

Foto: Arquivo pessoal/Verotides Jorge Teixeira Foto: Arquivo pessoal/Verotides Jorge Teixeira

No entanto, ele espera aumentar logo a produção na oficina e acredita que receberá apoio para ajudar essas e outras pessoas que o procurarem.  “Antes meu sonho era ter um sitio ou uma caminhonete algum dia, mas hoje meu maior sonho é encontrar mais pessoas que ajudem nesse trabalho. Quero muito que isso aconteça”.

Quem é Verotides?

Conhecido como “Tide”, o mineiro de 54 anos nasceu e cresceu no município de Conselheiro Lafaiete, onde começou a atuar como engraxate aos oito anos de idade. “Minha mãe era muito pobre e quase não tínhamos o que comer”, recorda o comerciante, que estudou apenas até a segunda série do Ensino Fundamental e nunca ficou sem trabalhar. “Depois de sair de porta em porta por alguns anos com minha caixa de engraxate, comecei a vender frutas, fui zelador, lavador de carros, auxiliar de mecânico, de pintura e motorista de caminhão”.

No entanto, por volta de 2005, decidiu ser vendedor autônomo e começou a negociar ferro velho na cidade. Hoje ele atua nessa área de segunda a sexta-feira, das 6h às 20h, e ganha o suficiente para sustentar dois filhos. “Não sou dono de um ferro velho, não sou perfeito e nem tenho uma boa condição financeira, mas faço o possível para cuidar da minha família e ajudar quem precisa”, finaliza Tide, que atende os doadores pelo telefone (31) 99654-1990.

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