Pesquisa acompanhou 20 mil pacientes de diferentes estados dos Estados Unidos e verificou a segurança da terapia
Pesquisa acompanhou 20 mil pacientes de diferentes estados dos Estados Unidos e verificou a segurança da terapia| Foto: Bigstock

Um dos mais recentes estudos sobre o uso do plasma convalescente contra a Covid-19 analisou a terapia em mais de 20 mil pacientes, nos Estados Unidos, e chegou a conclusão de que o tratamento é seguro – embora ainda não seja possível dizer se será eficaz.

Divulgada na quinta-feira (18) pela fundação Mayo de ensino e pesquisa médica, o estudo avaliou as reações dos pacientes ainda internados que recebiam o plasma sanguíneo de pessoas que haviam se recuperado da doença. A terapia foi aplicada entre os dias 3 de abril e 2 de junho, em diferentes cidades no país.

Dos resultados, os pesquisadores verificaram que a ocorrência de efeitos colaterais era rara, em menos de 1%. "A atualização dos dados oferece evidência robusta de que a transfusão do plasma convalescente é segura em pacientes hospitalizados com a Covid-19, e apoia a ideia de que uma administração precoce do plasma no curso clínico da Covid-19 é mais provável para reduzir a mortalidade", destacam os pesquisadores na conclusão do estudo.

Plasma convalescente

Quando alguém está infectado com um tipo de bactéria ou vírus, como o novo coronavírus, o organismo produz proteínas específicas, chamadas de anticorpos ou imunoglobulinas, que atuam contra esses agentes infecciosos. Se uma pessoa se recupera da doença, isso significa que o organismo soube se proteger e carrega essas informações de defesa por um tempo.

Como os anticorpos estão presentes no plasma sanguíneo – a parte líquida do sangue –, oferecê-lo a pacientes que não tiveram a mesma resposta contra o agente infeccioso pode servir de ajuda.

"O que vemos na Covid-19 é que alguns pacientes fazem o anticorpo IgG [imunoglobulina G, que indica que o organismo desenvolveu uma proteção de longo prazo contra a doença]. É como se eles estivessem 'vacinados'. Há pacientes que não desenvolvem IgG, e esses não servem como doadores. Somente pacientes que estão há mais de 30 dias sem sintomas e que tenham esse IgG alto na circulação serviriam de doadores", explica Cristiane Lange Saboia, médica hematologista e hemoterapeuta do Hospital Angelina Caron, em Curitiba.

O desenvolvimento desse anticorpo não depende da gravidade da Covid-19 que a pessoa teve de superar, porém pacientes mais graves tendem a ser doadores melhores. "Para o paciente doar o plasma, é preciso que atenda a diferentes critérios, mas não precisa necessariamente ter tido uma forma grave da doença. Mas ele não deve ter outra doença infecciosa, além de atender aos critérios da doação de sangue tradicional", completa.

Funciona?

Apesar de ter a segurança confirmada, e de a terapia ter sido usada em outros momentos (como contra a varicela e, mais recentemente, o Ebola), não há ainda estudos que comprovem a eficácia do uso do plasma convalescente contra a Covid-19.

"Foi uma avaliação de segurança, então parece que mal não faz, mas não sabemos ainda se, efetivamente, muda o desfecho do paciente", explica João Samuel Farias, médico hematologista responsável técnico pelo banco de sangue do Hospital Erasto Gaertner, em Curitiba, citando o estudo norte-americano.

Outra pesquisa, desenvolvida na China, e cujos resultados foram divulgados no início de junho pela revista científica Journal of the American Medical Association (JAMA), demonstrou que o plasma não teria efetividade no contexto do novo coronavírus. Em um ensaio clínico randomizado, a terapia foi comparada ao tratamento padrão em 103 pacientes graves. O estudo, porém, recebe críticas importantes, como o fato de ter sido finalizado antes do prazo.

"Do ponto de vista de eficácia foi negativo, e tudo que é negativo, embora não traga toxicidade, fica no zero a zero", pontua Johnny Camargo, médico hematologista e oncologista do Instituto de Oncologia do Paraná e do Hospital Erasto Gaertner. Ele ressalta ainda que não há, até o momento, algumas respostas importantes sobre o uso do plasma convalescente – além da eficácia.

"O timing, o momento de quando usá-lo no paciente, se seria no paciente mais grave ou em quem está começando os sintomas, é uma das questões. Os critérios de seleção desses pacientes, para saber quais evoluiriam mal ou não, também. De quem o plasma seria coletado, pacientes graves ou leves? São muitas variáveis dentro desse tipo de estudo, e que precisam ser controladas", reforça Camargo.

As respostas ainda virão, visto que há 278 estudos ao redor do mundo avaliando o uso do plasma convalescente contra a Covid-19, de acordo com dados da plataforma ClinicalTrials.gov. "Ainda são várias as dúvidas, mas esse tipo de procedimento já foi feito há anos, com a H1N1, contra o Ebola. Então, é mais uma opção que está sendo avaliada. Nesses outros casos não teve o uso disseminado, mas foi usado, e não se sabe quantos foram a óbito ou se teve melhora em função do plasma, porque não foi conclusivo", completa Cristiane Saboia, médica hematologista.

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