Estudos brasileiros indicaram a relação entre o coronavírus e a fertilidade masculina, afetando a produção dos espermatozoides
Estudos brasileiros indicaram a relação entre o coronavírus e a fertilidade masculina, afetando a produção dos espermatozoides| Foto: Bigstock

A capacidade de os espermatozoides se movimentarem e fertilizarem os óvulos tem um índice considerado normal de 50%. Entre homens que foram infectados pelo novo coronavírus e desenvolveram a Covid-19, no entanto, essa motilidade espermática se reduz a níveis entre 8% e 12%, de acordo com estudos conduzidos na Universidade de São Paulo.

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Mesmo passado um ano após a doença, os homens previamente infectados mantiveram essa baixa motilidade. Outra alteração percebida foi com relação aos níveis hormonais. Apesar de o nível normal da testosterona, em homens, ser de 300 a 500 nanogramas por decilitro de sangue (ng/dL), entre os homens que tiveram Covid-19, o hormônio chegou a valores abaixo de 200 e, muitas vezes, entre 70 a 80 ng/dL.

De acordo com Jorge Hallak, professor da Faculdade de Medicina da USP, e um dos pesquisadores, eles têm visto, cada vez mais, alterações prolongadas na qualidade do sêmen e dos hormônios dos pacientes que tiveram a Covid-19. "(...) mesmo naqueles que apresentaram quadro leve ou assintomático", explica Hallak, em entrevista para a Agência Fapesp.

Testículos e epidídimo

Estudos conduzidos em colaboração com o Departamento de Patologia da Faculdade revelaram que o SARS-CoV-2 é capaz de infectar também os testículos. Com isso, prejudicam a capacidade de as gônadas masculinas produzirem os espermatozoides e hormônios.

Segundo Hallak, isso acontece mesmo em casos assintomáticos ou com poucos sintomas. "Entre todos os agentes prejudiciais aos testículos que estudei até hoje, o SARS-CoV-2 parece ser muito atuante", destaca.

"Cada patologia tem particularidades que a prática e a experiência nos demonstram. O SARS-CoV-2 tem a característica de afetar a espermatogênese de formas que estamos descobrindo agora, como motilidade progressiva persistentemente muito baixa, sem alteração da concentração espermática significativa", explica Hallak à Agência Fapesp.

Os resultados vieram de uma análise com 26 pacientes que passaram pela Covid-19. A partir de exames de ultrassom, os pesquisadores observaram que mais da metade apresentava inflamação grave do epidídimo, a estrutura que é responsável pelo armazenamento dos espermatozoides, na qual eles adquirem a capacidade de locomoção. Os achados foram publicados na revista científica Andrology.

"Ao contrário de uma infecção bacteriana clássica ou por outros vírus, como o da caxumba, que causa inchaço e dor nos testículos em um terço dos acometidos, a epididimite causada pelo novo coronavírus é indolor e não pode ser diagnosticada por apalpamento [exame físico] ou a olho nu", alerta Hallak.

Avaliação médica

Diante dos achados, o especialista ressalta que os adolescentes e adultos jovens ou homens em idade reprodutiva, caso sejam infectados pelo novo coronavírus, devem buscar um urologista ou andrologista, após a doença, para serem avaliados.

Na consulta, devem ser avaliadas:

  • Mensuração do volume testicular;
  • Dosagem de testosterona e de outros hormônios;
  • Análise do sêmen com testes de função espermática;
  • Exame de ultrassom com Doppler colorido, para avaliar algum possível acometimento testicular que poderia afetar a fertilidade e produção hormonal.

"Esses indivíduos devem ser acompanhados por um a dois anos após a infecção, pelo menos, pois ainda não sabemos como a doença evolui", explica Hallak.

Coronavírus nas células do testículo

O mesmo grupo de pesquisadores também desenvolveu outro estudo, publicado na mesma revista científica, que indica que o novo coronavírus é capaz de invadir todos os tipos de células do testículo. Essa invasão pode prejudicar a função hormonal e a fertilidade masculina.

Para chegar aos resultados, os pesquisadores usaram técnicas de autópsia minimamente invasivas para retirar amostras de tecidos testiculares de 11 homens, com idade entre 32 e 88 anos, que morreram em decorrência de Covid-19 grave.

Em entrevista à Agência Fapesp, Amaro Nunes Duarte Neto, infectologista e patologista da FM-USP e do Instituto Adolfo Lutz, e coordenador do estudo, destaca que, mesmo em pacientes mais jovens, a quantidade de espermatozoides se mostrou bastante limitada. "O que nos chamou a atenção de imediato nesses pacientes que morreram em decorrência da Covid-19 foi a diminuição drástica da espermatogênese. Mesmo os mais jovens, em idade fértil, praticamente não tinham espermatozoides", explica.

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