De um lado, minhas expectativas; de outro, sua insegurança de não ser capaz o bastante para correspondê-las.
De um lado, minhas expectativas; de outro, sua insegurança de não ser capaz o bastante para correspondê-las.| Foto: Bigstock

“Tornar-se adulto” é tarefa difícil. Só me dei conta disso depois de “desconstruída” por filho que, vivendo sua adolescência, me fez enxergar – e aceitar – minhas falhas como parte deste processo de crescimento que dura a vida toda… para todos.

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Mudar minha lente sobre mim mesma foi fundamental para viver uma história diferente da comumente propagada entre pais e filho adolescente em duros conflitos. Enxergando
melhor, consegui exercer meu papel de mãe formadora mas, sobretudo, facilitadora e parceira de sua jornada de desenvolvimento.

A lente de filho adolescente

Fui mãe "super-herói" até a adolescência do filho. Desde então, virei uma espécie de vilã cheia de defeitos constantemente apontados quando tomava a frente de situações aparentemente difíceis para o filho.

Ocupada em formar adulto autônomo, me dediquei a cobrar do filho atitudes consonantes com minha ideia. O desejo era mútuo mas os meios de concretizá-lo, bem distintos. De
repente, minhas intervenções viraram motivo de críticas e desaprovações.

De um lado, minhas expectativas; de outro, sua insegurança de não ser capaz o bastante para correspondê-las. O resultado: reiteradas críticas… a mim. Meu exigente modelo de iniciativas, comunicação e postura diante da vida adulta que iniciava virou fonte de julgamento e condenações às minhas atitudes.

Assim descobriu que adultos não são tão perfeitos assim; nem eu, então ex-mãe-superherói agora imperfeitamente humana. Sim, a fase mudou e a lente de filho sobre os pais…
também.

A morte da mãe super-herói

Incontáveis vezes meu adolescente reclamou de minhas intervenções em situações de saia-justa em que, a meu ver, não sabia como lidar. Recordo algumas em que agi com o
objetivo de ajudá-lo mas, em troca, recebi duras repreensões:

— Saco, mãe! Precisava falar com o professor sobre a prova? Nada a ver!

— Pô, mãe, fala sério: você não contou pra minha tia que eu fiquei bravo com ela, né?

— Não, mãe, não creio que pediu a Dani pra me pegar em casa porque não queria ir sozinho de ônibus… brincadeira, hein, mãe!

Até, um dia, revelar mais:

— Me deixa resolver minhas coisas, mãe! Que saco!

A lente de incondicional admirador definitivamente mudara para a de irritadiço crítico em constante reatividade à minha interferência “em suas coisas”. A capa de super-herói de um passado ainda recente estava puída e, a cada dia, me escapava dos ombros.

A luta entre pais e filhos

Aprender a lidar, quiçá, resolver as próprias questões é exercício desafiador para o adolescente. O que aprendeu, observou e apreendeu quando criança se torna prova diária e prática que, apimentada pela ansiedade de pais desejosos de vê-lo “aprovado” - portanto “pronto” – faz dela um suplício contínuo.

Depois de muitas discussões com filho, finalmente entendi a complexa maturação adolescente: suas reações – verdadeiras ladainhas críticas – mostravam mais do que uma “rebeldia comum da fase”: denunciavam sua frustração de não corresponder minhas expectativas do que é ser adulto.

Mudar minha lente sobre filho também me fez enxergar diferente e descobrir o desconforto de um exigente caminho de ingresso ao mundo adulto que, por minhas interferências, dificultavam ainda mais seus iniciais e trôpegos passos.

O combate interno do adolescente

Por esta nova ótica, descobri que, uma das formas de meu adolescente tentar “passar na prova” foi, primeiro, desconstruir modelos da mãe super-herói expondo suas fragilidades. Ser criticada ‘ao estilo adolescente” – ou seja, de forma mal elaborada e mal expressada – sem melindres e com atenção me ajudou a entender e a mudar junto com ele.

Pelas críticas também me libertei da rota capa de super-herói e assumi minha humanidade desta vez sem personagens. Aceitar-me imperfeita aos olhos de filho ampliou minha visão sobre ser adulto nunca acabado e sempre em exercício de aprimoramento.

A experiência de ser vista pela lente imperfeita de filho adolescente, também mudei e, por isso, mudamos nossa relação hoje real – e possível – porque somos adultos que crescem juntos.

A meta maior de ser adulto

A experiência de ser julgada por filho adolescente me levou a desmistificar a ideia do adulto produto final pronto e acabado. De uma lente muitas vezes duramente realista, filho me reprovou como meio de conquistar direito de testar por si mesmo os modelos absorvidos e escolher, ainda que assustado, o mais condizente com o que busca se tornar.

Aceitar-me adulta imperfeita não me tornou mãe pior. Pelo contrário: ampliou minhas possibilidades de viver uma relação com filho adolescente em que a leitura de ambos, então mais limpa, realista e madura, nos faz perseguir meta ainda mais desafiadora: a de sermos adultos melhores a cada dia... apesar de nossas imperfeições.

*Xila Damian é escritora, palestrante e criadora do blog Minha mãe é um saco!, espaço em que conta as situações cotidianas e comuns que vive sendo mãe de adolescentes, buscando desmistificar clichês sobre essa fase dos filhos, para transformá-la em um tempo de aprendizado.

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