Reconhecer o adolescente manipulador assusta porque nos cobra atitude firme com filho e isso nos exige mais trabalho
Reconhecer o adolescente manipulador assusta porque nos cobra atitude firme com filho e isso nos exige mais trabalho.| Foto: Bigstock

Já se sentiu manipulada por filho adolescente? Já enxergou filho a priori “influenciador” ou então “determinado” e de repente descobriu se tratar, na verdade, de um adolescente manipulador? Eu já. Não só vivi esta experiência como só a percebi depois de reconhece-la em outra família.

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Displicentemente, vamos nutrindo nossos filhos com porções generosas de autoconfiança enviesada que, com o tempo, se torna assustadoramente permissiva. Portanto, assumir o adolescente manipulador como premissa pode até ajudar a nos precaver de um mal intencionado comportamento. Fiquemos, então, atentos: a chance de qualificar adolescente manipulador erroneamente é erro mais comum do que se imagina.

De fora, tudo fica tão evidente. Foi assistindo a atuação de pais envaidecidos (e condescendentes), que enxerguei meus erros com filho adolescente. De repente, vi quão fácil é nos tornamos reféns de filho, vítimas de nossa própria incompetência como educadores. O resultado? Uma sociedade composta por engodos disfarçados de líderes.

O orgulho dos pais de adolescente

Difícil de engolir mas adolescente é, naturalmente, um potencial manipulador. Sua incrível habilidade de argumentação ganha, na maioria das vezes, poder de domínio até sobre pais experientes.

O orgulho dos pais por seu filho pode ser perigoso. Embevecidos com a criatura, pais enxergam o que lhes convêm desviando o olhar do que lhes desagrada. Fingem não notar ajustes necessários que, muitas vezes, os induzem a erros capazes até de minar a formação do caráter de seu adolescente.

Vencidos pelo cansaço (ou por qualquer outro motivo), tendemos a nos submeter a adolescente manipulador sob a falaciosa imagem de jovem "determinado". É fato: filho desperta a vaidade dos pais e, sem dúvida, há motivos para isso.

O problema é nos deixarmos entorpecer pela “criatura” e vestirmos a capa de criadores de um ser "especial", meio mais rápido de incutir no filho a ideia de ser diferenciado e, por isso, merecedor de condições especiais para alcançar seus objetivos.

O adolescente manipulador

Falar de filho é conhecer a necessidade de contínuos ajustes. Afinal, formar outro ser é processo de aprimoramento... mútuo! E quando filho adolescente quer algo, sabemos quão difícil é ajustar seus esforços para consegui-lo.

Manter-se atenta ao adolescente naturalmente manipulador pode até soar um tanto exagerado. Admito que, depois de despertar para esta característica tão comum no adolescente, agi de modo muitas vezes inflexível em situações nem tão extremas assim.

Por outro lado, notei que minha atitude de certa forma o educou a não prescindir de minha atenção aos seus maniqueísmos para ver seus desejos realizados. Para tanto, precisaria antes me convencer com – bons – argumentos.

Pais conscientes e realistas

Em casa ou na rua, a tentativa perspicaz dos jovens de conseguir o que desejam "no matter what" é incessante e notória a pais – ou não – atentos à dinâmica na maioria das vezes facilmente reconhecível.

Você certamente já experimentou o poder de persuasão de seu filho e ouso afirmar: já sofreu com seu poder de convencimento. Considerar-se mais esperto do que o outro leva filho adolescente a sobrepor seus desejos em detrimento aos dos demais, a perseguir sua meta não importam as circunstâncias, a não medir esforços para obter o que quer, independente dos obstáculos.

Nesta busca frenética de alcançar seu objetivo, o adolescente vai se tornando potencial ameaça por crescer desconhecendo limites e se tornando perspicaz manipulador. Mas como diferir o comportamento até esperado do doentio? Pela resposta dada às suas tentativas de manipulação.

A lente distorcida de pais de manipulador

Depois de convencer a mãe de fazer a tatuagem desejada às custas de fracos argumentos – diga-se de passagem – o filho de 15 quis mais: fazer com um tatuador a 600km de distância de sua cidade.

— Mãe, sabe aquela tattoo que “vamo fazer”? – (“vamo”, quem, cara pálida? – pensei comigo) – Então... descobri um tatuador maneiríssimo em Santos, famoso e especialista no desenho que quero. Vou fazer com ele. – sentenciou.

— Como assim? Você não vai viajar para isso, filho! Aqui certamente há de existir um tatuador tão bom quanto este. Além do mais, já devia estar feliz de eu concordar com a decisão de se tatuar. Portanto, sossega... não há sentido em gastar tempo nem dinheiro dessa forma. – respondeu a mãe.

Sem retrucar, filho foi até a sala e se dirigiu ao pai dizendo:

— Pai, encontrei um tatuador super safo! O estúdio dele fica em Santos a algumas horas daqui. Além de especialista no desenho que quero, fez um preço camarada para compensar minha ida. Vamo comigo?

— Meio longe, não? – respondeu o pai distraidamente.

— Mas ele é "o cara", pai! Ah, vai! Não estressa. Você mesmo disse que gostou do desenho! Aliás, é em sua homenagem que vou fazer e não quero correr o risco de fazer feio, né?

— Nisso você tem razão... se vale mesmo a viagem...

Meta alcançada, os pais ressaltaram no episódio o perfil “assertivo” do filho:

— Ele é muito determinado. Sempre foi assim: focado. Quando quer alguma coisa, não desiste: vai até o fim! – disse a mãe orgulhosa.

Cegamente envaidecidos e preguiçosamente benevolentes justificaram o adolescente manipulador com a conhecida frase tantas vezes dita por aí: meu filho tem "personalidade forte".

Pais dispostos a enxergar

Aquele episódio me despertou para as ciladas vividas com meu filho adolescente. Aparentemente ingênuas, costumava me dobrar aos pedidos de filho cega às suas perniciosas articulações para obter até o que lhe fosse indevido.

A hábil capacidade de argumentação seduz e é mesmo capaz de cegar pais distraídos. Há de termos um olhar mais realista de pais capazes de reconhecer o poder sedutor e manipulativo de filho, de nos abster da lente vaidosa e assumir outra mais atenta nas – diversas – situações vividas com filho especialmente na fase em que exercitam com mais afinco suas “armas” de persuasão.

Reconhecer o adolescente manipulador assusta porque nos cobra atitude firme com filho e isso nos exige mais trabalho. Acabei por provocar aqueles pais à uma “revisão” daquele acordo abusivo. Para raiva do adolescente que viu em mim seu antagonista, os pais mudaram de opinião e forçando filho a buscar alternativa na cidade.

— Saco, é sempre assim! Vocês não me deixam fazer nada do jeito do que eu quero! – esbravejou o filho.

Pais e filhos saudáveis para o mundo

Dias de reclamação, mau humor, bicos, bufadas... nada diferente do imaginado e esperado. Afinal, adolescente manipulador tem disso: quando não consegue o que quer, esbraveja contra o mundo injusto que não o valida como o ser especial que se acha ser e se frustra por se deparar com limites comuns e necessários a todo adulto minimamente capaz de viver em sociedade.

Enfim pais cansados mas, ainda assim, dispostos a cumprir a missão maior que é formar adulto saudável para o mundo ajustando as infindáveis arestas que, a nos desafiar continuamente, também nos aperfeiçoa como pais de adolescente.

*Xila Damian é escritora, palestrante e criadora do blog Minha mãe é um saco!, espaço em que conta as situações cotidianas e comuns que vive sendo mãe de adolescentes, buscando desmistificar clichês sobre essa fase dos filhos, para transformá-la em um tempo de aprendizado.

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