A escola, com a ajuda das famílias, pode atuar na conscientização, reparação e prevenção do bullying.
A escola, com a ajuda das famílias, pode atuar na conscientização, reparação e prevenção do bullying.| Foto: Taylor Flowe/Unsplash

Às vezes, professores e coordenadores escolares afirmam que não há bullying em suas instituições de ensino ou minimizam as práticas dos alunos, equiparando-as a meras brincadeiras. Entretanto, se a mesma pergunta for feita aos alunos, será possível notar uma realidade oposta. Segundo a psicóloga Maressa Saldanha (CRP-PR 08/28378), infelizmente, o principal ambiente no qual as crianças e adolescentes sofrem esse tipo de agressão é o escolar, de modo que a escola deve ser protagonista também na prevenção do bullying.

“O aluno se sente desamparado, injustiçado, invalidado e muitas vezes passa a internalizar a culpa pelas agressões sofridas. Pode desenvolver transtornos psicológicos, doenças somáticas, ter atraso no desenvolvimento e problemas de socialização no decorrer de toda a sua vida”, alerta a profissional, que é especialista em psicologia jurídica.

Inclusive, há casos em que a dor de ter o pedido de socorro negado, sendo minimizado pelos pais e professores, agrava a violência em si, pois traz consigo a quebra de confiança nas pessoas que tinham o dever moral e legal de protegê-lo. “Por isso que falar de bullying e esclarecer o que é ou não eficaz na prevenção e combate é tão importante”, destaca ela.

Como identificar a prática do bullying no ambiente escolar?

Muitas vezes o bullying é identificado e detido quando praticado durante as aulas, na presença do professor. Porém, segundo Maressa, a troca dos docentes, a caminhada até salas de informática, laboratórios ou quadras de esporte, as aulas vagas e o intervalo são momentos em que há uma intensificação na violência, justamente pela crença dos agressores de que não estão sendo vistos e, logo, não serão punidos.

Para mudar este quadro, o advogado Alexandre Saldanha orienta que as escolas prevejam nos contratos educacionais e termos de matrícula a vigilância por meio de câmeras nas salas de aulas e ambientes de uso comum. “Desse modo, será possível mapear as ocorrências, apontar os envolvidos e inibir outros casos”, destaca ele, que é especialista em bullying.

Além disso, Maressa indica a importância de treinar os demais funcionários da escola, como faxineiros, cantineiras, auxiliares e bibliotecários, para identificar e intervir nas situações em que o bullying esteja acontecendo, bem como relatar para a coordenação de modo que as medidas necessárias sejam aplicadas.

Para identificar a prática da agressão, é necessário notar que o aluno demonstra sinais semelhantes aos que já apontamos nas matérias anteriores, como, por exemplo, isolamento social, desmotivação e baixo rendimento escolar, baixa autoestima, falta de cuidados com a higiene e machucados sem causa aparente.

Porém, a professora Camille Ulyssea, do Colégio Marista Paranaense, em Curitiba, acredita que o primeiro indicativo é a recorrência dos autores e das vítimas. “Quando percebemos que se tornam constantes os atos e os problemas, conseguimos identificar o bullying. Afinal, o contato diário com os alunos nos permite conhecer cada um deles de maneira única, facilitando com que possamos observar esses aspectos”, explica a docente.

Quais condutas podem ser tomadas pela escola?

Identificada a prática do bullying, Maressa ressalta que a primeira atitude a se tomar em relação à vítima seja o acolhimento; "Ela precisa perceber que a sua dor está sendo amparada, sua voz ouvida e seus sentimentos validados”, diz a profissional.

“É necessário fortalecer a vítima de forma que ela consiga superar e se proteger, se sentir segura diante da situação ou de possíveis situações futuras”, afirma Claudia Martins de Souza, coordenadora dos anos iniciais do ensino fundamental do Colégio Marista Paranaense.

Maressa destaca que ouvir a dor de uma vítima de violência não é simples e uma escuta especializada se faz necessária. “O objetivo aqui não é que ela esqueça ou apague a agressão que sofreu, é que ela possa retomar a sua vida da melhor forma possível, que possa ressignificar a sua história”, acrescenta.

E, em relação ao agressor, após a aplicação das sanções escolares que o farão compreender que as suas ações têm consequências, é necessário entender melhor as suas motivações para a prática da violência.

Por isso, é indicada a psicoterapia para ambos os casos. Afinal, o tratamento ajudará a vítima a perceber que não há nela nada que justifique a violência que sofreu, contribuindo para restaurar sua autoestima, construir sua autoimagem, voltar a se relacionar com as pessoas e confiar nelas. Já em relação ao praticante de bullying, torna-o capaz de compreender a dor que ele causou no seu colega, fazendo-o refletir sobre motivações superficiais e mais profundas que o levaram a praticar tal violência.

A prevenção do bullying deveria ser prioridade

Infelizmente, não há um único elemento que sozinho possa garantir a extinção da prática do bullying em ambiente escolar. Contudo, o próprio ambiente é o mais importante aliado no combate.

Segundo Maressa, isso se dá devido a alguns fatores:

  • o professor é o funcionário mais próximo do aluno no ambiente escolar, o que possibilita que observe o seu comportamento suspeito;
  • a proximidade e frequência em sala de aula, que favorece a criação do vínculo entre alunos e professores, possibilita o relato espontâneo das agressões sofridas pelas vítimas
  • e, em parceria com a coordenação, o professor pode desenvolver estratégias individualizadas para tratar as situações de bullying presentes em cada turma, pois tem uma visão mais clara de quais as demandas do grupo para o qual leciona e de quais estratégias terão maior impacto

Porém, a psicóloga acredita que o modo como tem sido feita a conscientização dos alunos atualmente não é eficaz na prevenção do bullying porque muitas escolas utilizam modelos desatualizados, que minimizam as consequências da agressão na vida da vítima, que trazem soluções mágicas e acreditam que frases como “devemos amar uns aos outros”, “somos todos iguais” vão agir no cerne do problema, o que não condiz com a realidade.

Alexandre corrobora: “A escola deve evitar formatos inúteis de prevenção, como conversas em grupo, rodadas de debate ou qualquer outro meio que coloque o aluno como foco principal dos olhares dos agressores efetivos e dos possíveis agressores. Esse tipo de atividade, além de expor o aluno ao ridículo, pode desencadear um linchamento social dentro da escola”.

Para os profissionais, para conscientizar a criança ou adolescente é preciso mostrar de que modo o bullying afeta a vida da vítima e de sua família, sem amenizar ou encobrir a verdade. “Esse impacto é necessário para que a empatia seja possível”, orienta Maressa, destacando a necessidade de mostrar ao agressor as consequências em curto e longo prazo, tanto judiciais quanto sociais, pois, se a empatia não se desenvolver, então deve haver o receio da punição.

Além da conscientização, reparação e prevenção do bullying realizadas pela escola, é fundamental que a família também contribua nessa questão. Por isso, Claudia indica a importância da parceria entre a família e a instituição de ensino. “O primeiro passo é a família aceitar o que a escola fala, confiar na equipe pedagógica para entender a criança ou adolescente e poder interferir de forma positiva neste comportamento ou situação”, indica a coordenadora escolar. Isso porque, caso contrário, negar o fato só vai atrapalhar o processo de inclusão e socialização.

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