Nem sempre é fácil conseguir agradecer ou aceitar a gratidão dos outros, mas praticar esse ato aumenta autoestima e melhora o sono.
Nem sempre é fácil conseguir agradecer ou aceitar a gratidão dos outros, mas praticar esse ato aumenta autoestima e melhora o sono.| Foto: Unsplash

Era para ser mais um dia normal na vida de um adolescente de 17 anos, mas a brincadeira na cama elástica se tornou um pesadelo, que deixou Lucas Camargo tetraplégico. Há três anos esse susto mudou a vida dele para sempre, mas, em especial, a forma como ele enxerga tudo o que acontece. “Hoje eu agradeço as pequenas vitórias”, revela o jovem.

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Com muita fisioterapia, Lucas conseguiu voltar a movimentar o pescoço, recuperou parte do movimento dos braços, mas não mexe as mãos nem controla o tronco. Uma cadeira motorizada traz mais qualidade de vida e com órteses ele consegue ter certa autonomia, mas depende de outras pessoas para fazer qualquer coisa. Ainda assim vê muitos motivos para agradecer.

“Qualquer ganho para mim, hoje em dia, é espetacular. Se eu conseguir comer sem derrubar um grão de arroz na mesa é uma bênção. Agora, se eu tivesse andando, isso não seria nada”, afirma. A psicóloga Thayane Leonardi esclarece que são justamente as pequenas vitórias as principais responsáveis pela melhor forma de verdadeiramente praticar a gratidão.

Valorizar-se é essencial

“Reconhecer nossas qualidades é muito importante. A gente tem uma voz dentro de nós apontando tudo o que a gente não é, tudo o que não conseguimos. Isso nos leva a um estado de inadequação e ansiedade”, diz. Por isso é essencial, na visão dela, conseguir mudar essa chave. “O que eu já sou? O que já faço? O que já consegui hoje? No que sou bom?”, completa.

A psicóloga analisa que essa dificuldade em reconhecer o próprio sucesso é uma resposta biológica. “No passado era necessário que nosso foco estivesse nos possíveis perigos que iam acontecer. Quando morávamos nas cavernas, sem antever os riscos eu poderia ser devorada por uma fera”, reflete ela.

Diante desse perigo e desconforto, de acordo com Thayane, o corpo reage com comportamento de fuga e luta: atacar ou fugir. “Isso foi necessário para a sobrevivência no passado, mas hoje os perigos são menores só que temos essa condição biológica de sempre olhar para a falta”, constata. Tentar sair desse ciclo é um passo importante para aprender a ser grato.

Saber agradecer gentilezas ou reconhecer o esforço de outra pessoa também não é fácil, em muitos casos. A psicóloga Vanessa Monti Chavez diz que é importante saber diferenciar se é uma dificuldade de expor o pensamento ou se a pessoa não tem o sentimento, acreditando ser uma obrigação do outro. “Se a pessoa não consegue ser grata ou não valoriza o outro nem reconhece as coisas boas que acontecem com ela, pode ser que não esteja feliz”, alerta.

Saber interpretar a linguagem com que o outro demonstra carinho e afeto também é essencial, na opinião de Vanessa. “Às vezes ela pode valorizar a outra pessoa através do jeito dela de amar”, exemplifica. Em outros casos, porém, avalia a psicóloga, a questão não envolve saber agradecer, mas sim, aceitar a gratidão ou a gentileza dos outros. Não se sentir merecedor pode se relacionar a uma questão de autoestima, como ela explica. “Em vez de aceitar os elogios a pessoa não consegue se apropriar disso, agradecer, acolher e poder se posicionar de acordo com isso porque não se observa com essa valia”, aponta.

Praticar é possível

Encontrar esse equilíbrio pode ser uma dificuldade, mas praticar a gratidão auxilia a ter uma visão mais leve sobre a vida e tudo aquilo que acontece ao redor. Thayane elenca alguns benefícios dessa prática e ressalta que, em um primeiro momento a saúde física melhora porque o estado de contentamento altera o eixo hormonal, estabilizando a produção de cortisol, responsável pelo estresse e adequando hormônios como a serotonina e adrenalina.

A psicóloga revela, ainda, que a gratidão aumenta a empatia, assim como melhora a saúde emocional e psicológica. “Ao mudar o foco da atenção produzo sentimentos internos de contentamento, tranquilidade e paz. E assim começo a experimentar mais sensações de prazer, calma e alegria”, destaca. Fazer essa reflexão antes de dormir ajuda até a melhorar o sono, ressalta a psicóloga.

E se está difícil achar bons momentos para agradecer, Lucas sugere algumas dicas: “Às vezes eu vejo o nascer do dia e sou muito grato por isso. Ou eu vejo o cantar dos pássaros. Como é lindo isso de manhã. Ou tomar um café quentinho. São coisas pequenas que enchem o coração”.

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