O medo não é quanto a sentir a felicidade plena, mas do que pode, supostamente, vir depois desse tempo de prazer, como uma tragédia.
O medo não é quanto a sentir a felicidade plena, mas do que pode, supostamente, vir depois desse tempo de prazer, como uma tragédia.| Foto:

Necessidade de escapar em situações felizes, deixar de frequentar bons lugares, evitar qualquer alegria, somado à dores de estômago e cabeça, ansiedade e até mesmo sensação de que algo ruim está para acontecer pode ser resultado de um trauma que impede que alguém sinta prazer em ser feliz.

Siga o Sempre Família no Instagram!

Josiane* perdeu o noivo em um trágico acidente de carro, durante os preparativos da cerimônia. Após o acontecimento, quando vê que está muito feliz, inicia até mesmo um processo depressivo, por medo de estar alegre com algo e perder um ente querido novamente. Na realidade, o medo não é quanto a sentir a felicidade plena, mas do que pode, supostamente, vir depois de tal prazer, como uma tragédia ou situação de dor intensa, explica Adriana Potexki, psicóloga certificada pelo EMDR Institute, palestrante e escritora.

“O medo em ser feliz está sempre atrelado a um momento de alegria, seguido de um acontecimento muito ruim que o destrói. Infelizmente, a felicidade torna-se um gatilho de medo de sentir a tristeza novamente”, diz.

Ainda que viver situações de estresse intensas desencadeiem estresse pós-traumático, não precisa ter ocorrido algo necessariamente para que o medo surja. Alguns pensamentos podem colocar o indivíduo em situações de "evitação" e o paralisar, sem que precise viver um trauma, destaca a psicóloga Mariane Louise Bonato.

Sinais de alerta

A evitação do indivíduo em se envolver em situações prazerosas ou em relacionamentos que gerem envolvimento com o objetivo de autopreservação devem alertá-lo, ou aos seus amigos e familiares, que algo não está bem.

Mariane destaca que buscar isolamento social, pouca exposição, sentimentos de desânimo ou não sentir prazer em atividades que antes eram agradáveis, ou até mesmo humor irritável, podem ser considerados sinais de alerta.

Porém, a psicóloga sinaliza que é necessário um cuidado com a negação de sentir emoções desagradáveis como a tristeza ou a raiva. Pois, todas as emoções, se equilibradas, têm função vital em uma vida saudável.

Assim, deve ser direcionado um olhar de cuidado para diferenciar se o medo em ser feliz não está mascarando sintomas depressivos, nos quais há sentimento de menos valia, falta de vontade e prazer, desânimo, isolamento social, inexpressividade emocional diante de eventos que possam gerar felicidade.

Como superar o medo e conseguir voltar a ser feliz?

A serviço de que estou sentindo medo? O que essa emoção quer comunicar a meu respeito ou minhas vivências? Essas são algumas das perguntas que Mariane orienta que sejam respondidas por aqueles que enfrentam esse medo. Afinal, todos têm o direito de encontrar a felicidade como caminho e viver momentos de alegria que ecoem pela vida.

“Uma vida plena é feita de momentos nos quais acessamos a felicidade, e estar atentos ao que vivemos a cada momento é um grande exercício diante das exigências da agitação do cotidiano. Direcionar nossa atenção de modo genuíno as emoções na execução de cada detalhe da nossa vida, mesmo que por poucos instantes, pode fazer uma grande diferença”, acrescenta.

Do mesmo modo que uma situação indesejada pode fragilizar, também pode criar oportunidades de mudança, de fortalecimento. Portanto, Mariane incentiva que as pessoas acometidas pelo medo em ser feliz desenvolvam a capacidade de enfrentamento e de autoconhecimento das habilidades para que rompa com um ciclo de esquiva de situações aversivas ou traumáticas.

“Um olhar genuíno para as próprias experiências, permitindo-se sentir, acessar as emoções com uma postura de menos julgamento e mais entendimento é um bom começo. Escutamos muito falar em empatia, compaixão, até mesmo perdão direcionado ao outro. Que tal iniciar com o exercício da autocompaixão?”, provoca a psicóloga.

Além desses questionamentos, Adriana Potexki destaca que, comprovado o medo da felicidade baseado em um trauma, é imprescindível que a pessoa procure superá-lo. A psicóloga relembra que o trauma altera o funcionamento cerebral e, portanto, precisa de um tratamento direcionado para que o cérebro volte à normalidade, desligando-se do passado. “Quando o cérebro entende que aquilo já passou há tantos anos, a pessoa se permite voltar a sentir a felicidade”, diz.

Como enfrentar a felicidade?

Certamente, todos nós apreciamos e buscamos a felicidade, pois nos traz sensações agradáveis, maior disposição, e benefícios para nossas relações. E, claro, não há nenhum mal em buscar a felicidade. Por isso, Mariane indica algumas formas para que o medo seja superado, e a pessoa possa viver um momento de alegria com prazer.

  • Identificar e reconhecer as emoções e sensações que vive a cada momento;
  • Se conectar com o aqui e agora;
  • Se permitir sentir de forma especial aqueles momentos de felicidade e bem-estar;
  • Exercícios de relaxamento, respiração e atenção plena;
  • Estar atento aos pequenos sinais valorosos da vida;
  • Cuidar das relações que estabelece com seus pares,
  • Fortalecer o autocuidado: envolver-se em atividades prazerosas, estabelecer prioridades, exercitar a autocompaixão e a responsabilidade pelas escolhas.

Além disso, Mariane orienta que a pessoa se questione se está disposta a enfrentar os medos, receios e fracassos, para ir em busca de uma vida com mais sentido, baseado em seus valores pessoais, naquilo que realmente importa em sua vida.

“A felicidade é uma construção, somos seres em constante transformação. Lançarmos perguntas a nós mesmos a respeito de como queremos viver e desfrutar de nossa vida é um exercício para nossa saúde mental que contribui para superação dos desafios”, conclui a profissional.

* Josiane é um nome fictício porque a personagem preferiu não se identificar.

Deixe sua opinião