Na proteção à saúde ou no apoio a famílias de baixa renda, voluntários se colocam na linha de frente e enfrentam os desafios da pandemia
| Foto: Hospital Pequeno Príncipe/Divulgação

Em um momento delicado para todas as estruturas da sociedade, onde o conselho geral é ficar em casa e evitar a aproximação ou o contato com outras pessoas, existem grupos que deixam o conforto de seus lares para dedicar seus recursos, tempo e trabalho no auxílio daqueles que mais precisam.

Seja na proteção à saúde ou no apoio de famílias de baixa renda que dependem de doações para garantir uma refeição à mesa, milhares de voluntários se colocam na linha de frente para enfrentar os desafios da pandemia. Na internet, principalmente nas redes sociais, centenas de pedidos de ajuda são compartilhados diariamente e, vez ou outra, as súplicas são atendidas por quem está do outro lado da tela.

Cuidando de quem cuida

Foi exatamente uma situação como essa que despertou o interesse da advogada Márcia Stacechen, moradora de Curitiba. A profissional, que segue à risca as recomendações de quarentena junto com a família, se deparou com o compartilhamento de uma mensagem no Facebook alertando que o Hospital Pequeno Príncipe precisava da doação de pijamas para proteção da equipe médica. As vestimentas garantem que os profissionais não levem o vírus para dentro de suas próprias casas.

A advogada decidiu entrar em contato com a instituição se oferecendo para ajudar. “Vi ali uma oportunidade para ocupar o meu dia durante a quarentena”, diz. Desde então Márcia não parou de contribuir para o hospital. Já foram entregues cerca de 47 peças e outra leva de 100 pijamas e 150 máscaras estão em produção.

Para dar maior fluidez na tarefa, ela conta ainda com o apoio dos dois filhos e do marido. A filha, aliás, não tinha prática alguma com a máquina de costura, mas fez questão de aprender a tarefa com a mãe para sair produzindo as vestimentas poucos minutos depois. “Ela nunca tinha costurado e foi me perguntar o que poderia fazer. Eu ensinei e 10 minutos depois ela já começou a produzir as roupas. O meu marido também me viu trabalhando e foi perguntar como poderia colaborar”, diz.

A ação, segundo Márcia, não tem prazo para terminar e irá ser feita enquanto for necessário. ”Se cada um ajuda com um pouco a ação cresce. Não é só com dinheiro. Tem muita gente que quer ajudar e não sabe como. Podemos contribuir de outras formas, não apenas financeiramente”, orienta.

O Hospital Pequeno Príncipe criou um canal exclusivo para quem quiser colaborar com a instituição durante a pandemia do Covid-19. Por meio da ferramenta, os interessados podem escolher entre as diversas formas de apoio. As possibilidades vão desde a doação de recursos financeiros até a participação em atividade voluntária na confecção de máscaras e pijamas. Para mais informações, basta acessar o site do hospital.

O alimento a quem tem fome

Já a professora Rosiany Lisboa de Araújo viu de perto o quanto a suspensão das aulas na rede pública afetou a rotina de dezenas de pessoas na comunidade onde trabalha, na periferia de São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba. Com o fechamento da escola, a interrupção das atividades comerciais e redução do fluxo de pessoas, muitas famílias que trabalham na informalidade deixaram de garantir a refeição, o que poderia comprometer a segurança alimentar desses alunos. Foi então que ela decidiu agir.

Também pelas redes sociais, a professora iniciou contato com outras servidoras públicas da escola e compartilhou os pedidos de doações para que fosse possível montar kits de café da manhã para as famílias dos estudantes afetados pela quarentena. A corrente do bem que começou há poucas semanas cruzou fronteiras e o pedido de ajuda chegou a outros municípios do Brasil, como Manaus e São Paulo e veio também de outros países, como Portugal, Suíça e EUA. “No primeiro dia foram entregues 35 kits. Já no segundo dia esse número subiu para 80 e por último doamos 100 kits de café da manhã”, orgulha-se.

E o que era para ser um ato pontual na comunidade próxima da escola tomou proporções maiores, graças às doações e a união de outros voluntários. Hoje o auxílio já chegou a três áreas de vulnerabilidade, passando a garantir não apenas o café, como a refeição do mês inteiro para muitas famílias por meio de cestas básicas.

Para a Páscoa, além dos alimentos, chocolates foram arrecadados para as crianças dessas comunidades. “As pessoas começaram a entrar em contato, curtir, compartilhar e recebemos telefonemas e mensagem de pessoas querendo ajudar”, diz. Segundo Rosany, a ação deve continuar ao longo de todo o período do isolamento forçado. “Seu olhar muda com relação ao outro nesse momento que está tudo tão difícil pra todo mundo”.

Conectando quem tem e quem precisa

Boas ideias podem surgir também de uma conversa informal com os amigos e acabar diminuindo o sofrimento de muita gente em pouco tempo. Foi justamente de um bate papo que cinco amigos criou uma plataforma que vem sendo bastante utilizada não só por quem precisa de ajuda, como também por àqueles que têm algo para oferecer, mas não sabem onde encontrar quem precisa. O site Existe Amor em Curitiba foi criado a partir da situação de emergência causada pela pandemia do Covid-19.

Os idealizadores perceberam várias iniciativas surgindo na cidade para dar suporte a pessoas em situação de vulnerabilidade e viram a necessidade da criação de uma plataforma que centralizasse todas essas solicitações de ajuda para que as ações fossem mais efetivas e chegassem com maior rapidez para quem precisa. A ideia é simples: conectar quem precisa de ajuda com quem oferece ajuda.

O site oferece um passo a passo para cadastramento de entidades e voluntários bastante intuitivo até para quem não tem muita intimidade com a internet. Na primeira página um vídeo tutorial ensina como utilizar a plataforma. A rede é totalmente orgânica e autogerenciável. As informações são inseridas pelos próprios usuários.

Em pouco mais de um mês no ar, o portal cresceu de forma bastante rápida, contabilizando quase 450 iniciativas cadastradas, entre ofertas e procura de ajuda e mais de 40 mil acessos em todo o Brasil. Atualmente já estão registradas ações em 27 municípios de 8 estados do Brasil. As iniciativas vão desde doações até aconselhamento médico e psicológico para pessoas que precisam enfrentar sozinhas o período de isolamento social.

Lucas Kogut, um dos criadores, conta que a plataforma foi desenvolvida de uma maneira que facilite a replicação. "Nós desenvolvemos uma plataforma simples e fácil, justamente com o objetivo de expandir as boas ações para todo o Brasil". As próximas cidades a receber o projeto são: Catalão (GO), Campina Grande do Sul (PR), Cantagalo (RJ), São Gonçalo (RJ), Vassouras (RJ), Magé (RJ), Duque de Caxias (RJ), Armação dos Búzios (RJ), Maricá (RJ), São Paulo (SP) e Cajamar (SP).

Em pouco tempo, os amigos já viram a ação dar bons resultados. Um deles é o caso do Asilo São Vicente de Paulo, instituição sem fins lucrativos, dirigido ao atendimento de mulheres idosas, que recebeu uma série de ajudas vindas de colaborações compartilhadas pela plataforma, como conta Fred Dias, analista de treinamento e desenvolvimento do asilo. "Por meio do Existe Amor em Curitiba, nós recebemos doações de alimentos, álcool em gel e ajuda financeira, itens essenciais ao suporte às idosas". 

Fred comenta ainda que, nesta época de pandemia, o volume de doações caiu cerca de 95%, e que a iniciativa foi essencial para pensar em outras formas de conseguir novas ajudas. "É uma época difícil, precisamos de muito suporte, principalmente por essa queda nas contribuições. A plataforma está fazendo toda a diferença para nós".

Para conhecer o projeto Existe Amor em Curitiba, oferecer ou receber ajuda, basta acessar o site deles. O contato acontece diretamente entre quem oferta e recebe a doação. A plataforma funciona de forma totalmente gratuita e não recebe nenhum tipo de valor pela plataforma.

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