Obesos jovens que morreram por Covid-19 ultrapassam o número de mais velhos com esta comorbidade.
As complicações mais comuns estão relacionadas a desdobramentos pulmonares, cardiovasculares, renais e neurológicos.| Foto: Bigstock

Durante esta longa pandemia, muitas vezes lemos notícias sobre óbitos nas quais se afirma que uma pessoa morreu por complicações decorrentes da Covid-19. Mas quais seriam essas complicações e quando elas costumam surgir em um internamento?

Siga o Sempre Família no Instagram!

Geralmente, a morte pela forma aguda da Covid-19 (pela própria doença causada pelo vírus) não é algo comum nas unidades de terapia intensiva (UTIs), como explica o médico intensivista Jarbas da Silva Motta Junior, do Hospital Marcelino Champagnat. “A morte na fase aguda, nos primeiros dias, ocorre ou quando o paciente chega com uma forma muito grave da doença ou de modo tardio à UTI, com pulmão bem comprometido; ou por eventos cardiovasculares, por infarto; ou por trombose pulmonar; ou por miocardite, que é a inflamação do coração. Essas são as principais causas de óbitos em fase mais aguda da doença e ocorrem em até cinco dias de internamento”, diz.

É consenso afirmar que a doença da Covid-19 se divide em três fases: a primeira, de virulência, na qual os pacientes ainda estão em casa e costuma durar até os sete primeiros dias; a segunda fase, da inflamação, que vai do sétimo ao décimo quarto dia, que é quando os pacientes chegam ao hospital ou já à UTI; e a terceira fase, das consequências dessa inflamação, em que é constatada a lesão pulmonar e se investe na recuperação, que pode demorar muito, a depender dos estragos prévios da doença.

Complicações da doença

Grande parte das mortes ocorre após um maior período de internamento, pelas complicações decorrentes da doença, entre as mais frequentes, segundo a médica Adriana Blanco, coordenadora do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar do Hospital Santa Cruz, as relacionadas a desdobramentos pulmonares, cardiovasculares, renais e neurológicos.

Normalmente, no cerne de muitas dessas mortes estão as infecções secundárias, infecções hospitalares com bactérias resistentes que, no caso do tratamento da Covid-19, podem surgir em diversos momentos. “Podem decorrer da dificuldade de se tirar a ventilação, da necessidade de recrutar veias para fazer drogas para aumentar a pressão, e aí levando à disfunção de múltiplos órgãos, com piora da função renal e piora do fígado. Isso ocorre também em pacientes que fazem a Covid muito grave, quando a lesão pulmonar é tão extensa que dificulta a troca do oxigênio pelo gás carbônico, quando dizemos que o pulmão ficou duro, uma fibrose pulmonar que dificulta a troca de gases”.

Tempo de UTI joga contra

O tempo de internamento em UTI, que exige a Covid-19, predispõe a desfechos negativos e, de acordo com Adriana, esse período depende do grau de comprometimento pulmonar pela doença e das comorbidades pré-existentes do paciente. “Cada paciente evolui de forma particular e conforme condições de doenças pré-existentes: há quem chegue à UTI no 3°dia doença e há outros que chegam no 15° dia de doença, por exemplo, então não existe padrão”, diz ela.

Porém, quanto mais longa a permanência na UTI, de acordo com Motta Junior, maior a predisposição a infecções bacterianas, devido ao maior período de ventilação mecânica e de sedação, que favorece a queda da imunidade, propiciando desfechos secundários. “Contribuem para as infecções, ainda, o uso de corticoide para tentar diminuir a inflamação pela doença, a sedação prolongada, a ventilação mecânica, a necessidade de acessos vasculares para infusão de drogas. Todos esses são fatores de quebra de barreiras para infecções”, diz ele.

Sintomas de infecção

Os primeiros e principais sintomas iniciais do surgimento de uma infecção bacteriana em um paciente que está sendo tratado da Covid-19 são: a volta da febre, a piora da secreção pelo tubo em pacientes em ventilação mecânica, a piora dos exames laboratoriais em índices como de leucócitos e PCR (proteína C-reativa) e, em casos mais graves, a queda da pressão e o surgimento de disfunções em outros órgãos como rins e fígado, sendo esses sinais de que o paciente pode estar evoluindo com infecção bacteriana.

Segundo Adriana Blanco, o risco de infecções em pacientes internados em unidades de tratamento intensivo é diariamente monitorizado com exames laboratoriais e são eles que frequentemente alertam para algum comprometimento infeccioso.

Momentos-chave do internamento

Durante o período de internamento, qual seria o momento-chave que caracterizaria que a batalha contra a Covid-19 pode ou não estar ficando mais dura para o paciente da UTI?

Apesar de ser difícil afirmar de maneira geral, o médico intensivista Motta Júnior estima que este momento aconteça a partir do 10º dia na UTI. É nessa hora que, ao se observar que o quadro do paciente não está complicando e evoluindo de forma mais crônica, pode-se pensar em um início de recuperação. “Porém, há exemplos de pacientes que evoluíam de forma desfavorável e ocorreu uma reviravolta”, diz ele.

Sinais de melhora

Entre os sinais que apontam para uma melhora do paciente na UTI está, segundo Adriana, especialmente a diminuição da necessidade do uso do oxigênio pelo paciente. Essa melhora da oxigenação do organismo revela que a parte respiratória está estabilizando e que logo se poderá também tirar a sedação, conseguindo diminuir parâmetros da ventilação, um sinal importante de que a recuperação está avançando.

Por outro lado, quando começa a surgir a necessidade de substituição da função de um órgão por procedimentos externos, isso pode apontar um agravamento da situação. A diálise, por exemplo, é recrutada quando a disfunção atinge o rim, sendo necessária a substituição renal pela diálise, que retira substâncias tóxicas ao organismo, papel desempenhado pelos rins quando a pessoa está sadia.

As complicações renais são frequentes em pacientes com quadros mais graves de Covid-19 e tem como uma das causas, segundo Adriana, a “tempestade” inflamatória (resposta exagerada do sistema imune na tentativa de combater o vírus) que pode também afetar os órgãos causando inflamação, a chamada nefrite. “Se estuda ainda a ação direta do vírus nos rins, as alterações causadas pela trombose e os efeitos hemodinâmicos – relacionados a medicamentos eventualmente necessários no tratamento e até na ventilação mecânica – que podem prejudicar a função dos órgãos e levar a quadros de insuficiência renal aguda”, diz ela.

Além disso, a disfunção renal pode ser causada pela própria doença da Covid, às vezes por alteração da oxigenação ou da pressão, em pacientes que precisam ser sedados mas, principalmente, ela pode aparecer em pacientes que evoluem com infecções secundárias bacterianas, que atinge diversos órgãos e, principalmente, os rins, explica Motta Júnior.

Sem testes no internamento

Como a fase da virulência é delimitada, segundo Adriana a realização do PCR para verificação da presença do vírus ocorre apenas no momento da internação e, sendo o resultado positivo, não há necessidade de refazer o teste. “O paciente internado com sintomas mais graves permanece em isolamento respiratório por um período mínimo de 20 dias. Os pacientes sem necessidade de internação, com sintomas mais leves, são orientados a manter isolamento por 10 dias e sem sintomas há pelo menos 24 horas”, diz ela.

Motta Júnior diz que não se testa além do momento da internação porque, após um tempo, mesmo se for encontrado o vírus no organismo ele estará inativo, então essa aferição não faria diferença no decorrer do internamento.

Deixe sua opinião