Pesquisas foram conduzidas nos Estados Unidos, Canadá e Espanha e resultados embasaram novas recomendações de entidade médica
Pesquisas foram conduzidas nos Estados Unidos, Canadá e Espanha e resultados embasaram novas recomendações de entidade médica| Foto: Bigstock

Resultados de duas pesquisas que avaliaram o uso da medicação hidroxicloroquina no contexto da Covid-19 foram divulgados nesta quinta-feira (16), e replicados pela Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) nesta sexta (17). As pesquisas testaram o uso da substância em pacientes que ou estavam no início dos sintomas da infecção pelo novo coronavírus ou apresentavam sintomas leves para a doença.

Grupos de médicos no Brasil e no mundo têm feito uso desses medicamentos nas primeiras fases do tratamento da doença e se baseiam em estudos empíricos para pleitear sua adoção em protocolos de saúde pública.

O primeiro estudo, conduzido nos Estados Unidos e no Canadá, dividiu 423 pacientes em dois grupos: os que receberam a hidroxicloroquina e o grupo placebo (que recebeu uma medicação neutra, para fins de comparação). De acordo com os resultados, publicados no periódico científico Annals of Internal Medicine, não houve diferença significativa entre os dois grupos com relação à severidade dos sintomas. Entre os 14 dias de uso do remédio, 24% dos participantes que receberam a medicação tiveram os sintomas, enquanto que o mesmo foi percebido entre 30% dos que receberam placebo. Em números de pacientes, a diferença foi de 10 pessoas.

O que dizem as pesquisas

Efeitos adversos da hidroxicloroquina foram registrados entre 43% dos participantes que receberam essa medicação. No grupo placebo, 10 pacientes foram hospitalizados (dois deles sem relação com a Covid-19), e uma morte. No grupo que fez uso da medicação, foram registradas quatro internamentos, e uma morte de um paciente que não estava internado.

Como conclusão, os pesquisadores alegam que a "hidroxicloroquina não reduziu substancialmente a severidade dos sintomas em pacientes ambulatoriais com sintomas iniciais e leves da Covid-19". A pesquisa deixa claro, ainda, as limitações do estudo, alertando que "apenas 58% dos participantes fizeram o teste para o Sars-Cov-2 devido a escassez de testes nos Estados Unidos."

O segundo estudo, publicado na revista científica Clinical Infectious Disease, foi conduzido na Espanha e dividiu 293 pacientes em, também, dois grupos: um que receberia a medicação e outro que serviria de controle. Neste caso, não foi ofertado um medicamento placebo, apenas o tratamento padrão.

O objetivo dos pesquisadores era verificar se havia uma redução na carga viral dos participantes nos dias seguintes ao uso da medicação. A hidroxicloroquina atuaria, a princípio, no impedimento da replicação do vírus no organismo humano – reduzindo, dessa forma, a gravidade dos sintomas e o avanço da doença. No entanto, segundo os pesquisadores, não foi percebida nenhuma diferença significante de redução da carga viral no dia 3 ou dia 7, depois de início do tratamento precoce.

"Esse regime de tratamento não reduziu o risco de hospitalização e não diminuiu o tempo de resolução dos sintomas. Em pacientes com sintomas leves da Covid-19, não foi observado benefício com a hidroxicloroquina além do tratamento habitual", destacam os pesquisadores.

Entidade médica atualiza recomendações

Nesta sexta-feira (17), a Sociedade Brasileira de Infectologia atualizou as recomendações com relação ao tratamento da Covid-19, e com base nos dois estudos citados acima, destaca que:

"Como já haviam sido publicados estudos clínicos randomizados com grupo controle demonstrando que a HCQ [hidroxicloroquina] não traz benefício clínico nem na profilaxia (prevenção), nem em pacientes hospitalizados, esses dois estudos completam a avaliação de eficácia e segurança do seu uso nas três fases da doença: profilaxia, tratamento precoce (primeiros dias de sintomas) e pacientes hospitalizados (que geralmente ocorre próximo ao 7º dia de sintomas)."

Os infectologistas pedem ainda que "a hidroxicloroquina seja abandonada no tratamento de qualquer fase da COVID-19; os agentes públicos, incluindo municípios, estados e Ministério da Saúde reavaliem suas orientações de tratamento, não gastando dinheiro público em tratamentos que são comprovadamente ineficazes e que podem causar efeitos colaterais; que o recurso público seja usado em medicamentos que são comprovadamente eficazes e seguros para pacientes com COVID-19 e que estão em falta", explicam.

A entidade lista ainda que estão em falta "anestésicos para intubação orotraqueal de pacientes que precisam ser submetidos à ventilação mecânica, bloqueadores neuromusculares para pacientes em ventilação mecânica; aparelhos que podem permitir o diagnóstico precoce de COVID grave, como oxímetros para o diagnóstico da hipóxia silenciosa; testes diagnósticos de RTPCR da nasofaringe para pacientes sintomáticos; leitos de Unidade de Terapia Intensiva, bem como recursos humanos (profissionais de saúde) e respiradores".

Outras instituições seguem a mesma linha que a SBI, como a Fiocruz e o Conselho Nacional de Saúde (CNS). Nesta sexta-feira (17), a CNS publicou no site um reforço da posição da Fiocruz, e destacou que o uso da hidroxicloroquina de forma massificada seria um risco à população, e que o tratamento precoce também não deve ser estimulado.

O Ministério da Saúde, porém, recomenda o uso de um protocolo de tratamento precoce, que inclui a hidroxicloroquina. O objetivo da pasta é, com o protocolo, reduzir o número de internamentos relacionados à Covid-19.

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