Perda de memória, dificuldade de concentração e até prejuízo na coordenação motora foram relatados pelos participantes
Perda de memória, dificuldade de concentração e até prejuízo na coordenação motora foram relatados pelos participantes.| Foto: Bigstock

Pesquisadores do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas (InCor) da Faculdade de Medicina da USP perceberam que a maior parte das pessoas que tiveram Covid-19 – mesmo com sintomas leves – desenvolveu também sinais de disfunções cognitivas. O estudo, na primeira fase, analisou 185 pessoas, entre março e setembro de 2020, e verificou que em 80% dos participantes havia relatos de:

  • Dificuldade de concentração ou atenção;
  • Perda de memória;
  • Dificuldade em lembrar-se de certas coisas;
  • Problemas com a compreensão ou entendimento;
  • Dificuldades com julgamento e raciocínio;
  • Prejuízo nas habilidades;
  • Problemas na execução de tarefas;
  • Mudanças comportamentais e emocionais;
  • Confusão.

Os dados, compartilhados pela Agência Brasil, foram colhidos a partir do uso de um jogo digital chamado de MentalPlus®️, desenvolvido pela neuropsicóloga Lívia Stocco Sanches Valentin, que também conduziu a pesquisa. O jogo foi usado para avaliação e reabilitação da função cognitiva em pacientes que passaram pela Covid-19, e estavam sem sintomas para a doença.

De acordo com a pesquisadora, os resultados do estudo demonstram que a recuperação física do paciente não implica uma recuperação cognitiva, que deve ser levada em consideração pelos profissionais da saúde.

"Isso deixa clara a importância de se incluir na avaliação clínica dos pacientes pós-Covid-19, de qualquer gravidade, sintomas de problemas cognitivos como sonolência diurna excessiva, fadiga, torpor e lapsos de memória para que, com o diagnóstico precoce, possa haver uma rápida intervenção terapêutica", explica Valentin, em entrevista à Agência Brasil.

No momento, a pesquisa acompanha 430 pacientes e a Organização Mundial da Saúde aguarda os resultados finais para adotar a metodologia como padrão-ouro, em âmbito mundial, para o diagnóstico e a reabilitação da disfunção cognitiva pós-Covid-19.

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Coordenação motora

Uma diminuição na capacidade visuoperceptiva também foi detectada no estudo. Segundo a pesquisadora, Lívia Valentin, muitos pacientes relatavam perderem a coordenação motora e caírem.

"Em uma pessoa saudável, essa função [motora] faz com que ela planeje o dia e busque estratégias para atenuar problemas. Se a pessoa perde essa função ou se ela ficar comprometida, isso pode interferir no trabalho e nas relações sociais, e, com isso, levar à depressão, ansiedade, angústia e agressividade".

Como a Covid-19 afeta a função cognitiva?

As sequelas cognitivas acontecem, segundo a médica, porque o coronavírus entra pelas vias aéreas, compromete o pulmão e, com isso, reduz o nível de oxigênio. "A dessaturação de oxigênio vai para o cérebro, acomete o sistema nervoso central e afeta as funções cognitivas", detalha.

Por exemplo, o estudo identificou que a memória de curto prazo de 62,7% dos participantes foi afetada. A de longo prazo sofreu alterações em 26,8% dos voluntários. Com relação à percepção visual, o impacto foi notado em 92,4%.

Segundo Valentin, isso acontece "por causa dos problemas que a Covid-19 acarreta nos lobos parietais e occipitais. Estes lobos são responsáveis pelo planejamento, organização visuoperceptiva e visuoconstrutiva, pelas sensações corporais, pelos movimentos primários entre outras funções importantes do ser humano".

Recuperação

O quadro deixado pela Covid-19 é passível de reversão, segundo a neuropsicóloga, por meio de exercícios cognitivos específicos como os do aplicativo usado no estudo. A atividade funciona como uma "musculação mental". 

Quando forçamos uma atividade do cérebro, o órgão acaba consumindo mais oxigênio, melhorando o desempenho aos poucos. "Quanto mais cedo tiver início a terapia cognitiva, mais rápida será a recuperação e, consequentemente, menores os prejuízos mental, emocional, físico e social para essas pessoas".

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