Novembro azul, mês da saúde do homem, recorda que câncer de próstata tem grandes chances de cura quando diagnosticado precocemente.
Novembro azul, mês da saúde do homem, recorda que câncer de próstata tem grandes chances de cura quando diagnosticado precocemente.| Foto: Naveen Pandey/Unsplash

As mulheres cuidam mais da saúde do que os homens? Ao menos sob um aspecto, um levantamento recente realizado pela Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) confirmou essa percepção: somente em 2022 foram registrados mais de 1,2 milhão de atendimentos femininos por médicos ginecologistas no Sistema Único de Saúde (SUS), contra apenas 200 mil atendimentos de homens por urologistas. 

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Na faixa etária de 12 a 18 anos, essa diferença é ainda mais gritante: as consultas das meninas na ginecologia são 18 vezes mais frequentes do que as dos meninos com urologistas. Deixando os cuidados do pediatra, é comum que as garotas comecem as consultas de rotina com o ginecologista ainda na puberdade, sem interromper o acompanhamento rotineiro de sua saúde. É um hábito que os homens, em geral, não têm – mas que deveriam ter.

Na verdade, o cenário já está mudando. “É cada vez mais comum que pacientes jovens e sem qualquer queixa urinária procurem o urologista para já iniciar acompanhamento em relação à próstata. Essa conscientização ocorre graças às campanhas informativas que há anos vêm sido promovidas pela SBU”, diz Andrei Amatuzzi, urologista do Hospital Santa Cruz. A campanha #VemProUro, por exemplo, é voltada ao público adolescente e acontece desde 2018.

No Brasil, os homens vivem, em média, sete anos a menos que as mulheres, segundo a estimativa de vida calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Uma série de fatores contribuem para essa diferença, e entre eles está a falta de acompanhamento médico, que impede diagnósticos precoces e tratamentos mais efetivos. Não por acaso, o índice de mortalidade em quase todas as causas de óbito é maior em homens que em mulheres.

O principal motivo de preocupação para a saúde masculina é o câncer de próstata, o segundo tipo de câncer que mais atinge os homens, atrás apenas do câncer de pele não melanoma. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), no Brasil, todos os anos são diagnosticados cerca de 65 mil novos casos, enquanto o número de óbitos chega a 15 mil.

Entendendo a próstata

O papel da próstata é produzir um fluido que compõe o esperma, juntamente com o líquido produzido pelas vesículas seminais e com os espermatozoides, produzidos nos testículos. Além de dar maior mobilidade aos espermatozoides, o fluido prostático prolonga a sua vida útil após a ejaculação, porque a sua alcalinidade ajuda a neutralizar a acidez do trato vaginal.

“A próstata é pequena, do tamanho de uma noz ou de uma ameixa pequena, com cerca de 20 gramas”, explica André Matos de Oliveira, professor da Escola de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). “Só que com o passar dos anos, principalmente depois dos 40 anos, ela pode crescer. Com o passar das décadas, esse crescimento é progressivo e, aos 80 anos, quase todos os homens têm a próstata acima do que se considera o tamanho normal, ou seja, com um peso de até 30 gramas”, comenta o urologista.

É o que é chamado de hiperplasia prostática, um aumento benigno do tamanho da próstata que atinge por volta de um quarto dos homens na faixa dos 40 aos 49 anos, chegando a 80% na faixa entre 70 e 80 anos. Com esse crescimento, a glândula pode passar do tamanho de uma noz à dimensão de uma bola de tênis.

Sinais de alerta

Muitas vezes não é necessário tratamento para a hiperplasia prostática – o problema é que, como a uretra, o canal da urina, passa no meio da próstata, esse crescimento pode alterar o padrão urinário. Já a urina estagnada pode também favorecer o aparecimento de infecções e de cálculos renais. Por isso, diante de problemas para urinar, deve-se procurar um médico. “Todos os homens devem ficar atentos aos sinais de alteração da próstata, como diminuição do jato urinário, dificuldade de esvaziar toda a bexiga, acordar várias vezes à noite para urinar”, ressalta Amatuzzi.

Se é necessário se consultar com o urologista para averiguar o que está acontecendo diante desses sintomas, possibilitando, assim, o diagnóstico precoce do câncer quando for o caso, é verdade também que o câncer pode se desenvolver sem manifestar qualquer alteração no padrão urinário ou em outro aspecto da vida do homem. “Devemos ficar atentos porque muitos pacientes que têm diagnóstico de câncer de próstata não apresentam qualquer queixa, e por isso, consultas regulares com o urologista são de suma importância a partir dos 40 anos”, observa o médico.

Segundo o Instituto Nacional de Câncer, cerca de 20% dos pacientes com câncer de próstata são diagnosticados somente pelo exame de toque retal, que permite avaliar alterações na glândula, como o seu endurecimento e a presença de nódulos suspeitos. O exame pode ser a única forma de diagnosticar o câncer antes que ele avance e o tratamento se torne menos efetivo – e a cura, talvez impossível.

Não se sabe ainda com precisão a causa do câncer de próstata, mas as pesquisas sugerem que alguns fatores têm um peso importante no desenvolvimento da doença. “É sabido que os principais fatores de risco para doenças da próstata, principalmente o câncer prostático, são o envelhecimento e a história familiar, já que o risco é maior quando pais e irmãos foram acometidos pela doença”, diz Amatuzzi.

O papel dos bons hábitos

Mas se, por um lado, esses dois fatores são elementos diante dos quais não há muito o que fazer, por outro, manter uma dieta saudável e uma rotina de exercícios físicos também tem o seu impacto na prevenção. “Sem dúvida os hábitos de vida são os fatores modificáveis mais importantes em que o homem pode agir”, comenta Oliveira.

“Existem evidências de que uma dieta rica em frutas, verduras, legumes, grãos e cereais integrais e pobre em gordura, principalmente as de origem animal, não só ajuda a diminuir o risco de câncer, como também o risco de outras doenças crônicas como doenças cardiológicas e diabetes”, explica Andrei Amatuzzi.

Uma das razões para tanto é a correlação que a obesidade pode ter com o câncer de próstata, como apontam pesquisas recentes. Um estudo britânico publicado em maio no periódico BMC Medicine descobriu que a cada 10 cm (3,9 polegadas) na cintura de um homem, os riscos de morte por câncer de próstata aumentam em 7%. Segundo a autora Aurora Perez-Cornago, da Universidade de Oxford, a relação não é de causalidade e os motivos da correlação ainda não são claros, mas os resultados ressaltam os benefícios de manter um peso saudável.

“Mais do que a atividade física em si, o controle do peso faz grande diferença na saúde da próstata, tanto em relação à hiperplasia prostática, quanto em relação à diminuição da chance de câncer na próstata”, corrobora André Matos de Oliveira, que indica ainda que se evite o cigarro e o álcool, bem como o excesso de gorduras e açúcares. “Manter o peso, realizar atividades físicas, principalmente aeróbicas, e a alimentação saudável são fatores essenciais”, recomenda o médico.

Problemas na próstata e vida sexual

A hiperplasia prostática não afeta a qualidade da vida sexual do homem. “Com o passar dos anos e a próstata crescendo de tamanho, os homens podem manter a ereção e a ejaculação de forma normal”, explica Oliveira. O impacto na vida sexual pode acontecer, porém, quando se realizam tratamentos para os problemas da próstata.

“Os tratamentos para o crescimento benigno podem causar mudanças na ejaculação, mas a ereção e o orgasmo são mantidos. Quando se fazem cirurgias maiores e mais complexas, que tratam o câncer da próstata, em que a glândula é removida inteira, junto com a sua cápsula, pode ser que em alguns homens aconteça o comprometimento da ereção, dependendo do prejuízo e do grau do câncer”, especifica o professor. “Mas felizmente hoje a tecnologia dessas cirurgias melhorou muito”.

Oliveira cita o uso do holmium laser, ou HoLEP, para a enucleação da próstata em casos de hiperplasia benigna, e a cirurgia robótica em casos de câncer – tecnologias que diminuem os riscos de efeitos colaterais do tratamento. A enucleação da próstata com o HoLEP é feita por um aparelho de endoscopia introduzido pelo canal urinário que usa um laser pulsátil. Quando acionado, a energia liberada causa o branqueamento dos tecidos e o laser corta, vaporiza e coagula os tecidos.

Já a prostatectomia robótica é um tipo de cirurgia em que o cirurgião opera em um console que controla os braços robóticos que realizam no paciente os movimentos precisos exigidos pela cirurgia. Com isso, existe a possibilidade de uma cirurgia minimamente invasiva, realizada por meio de pequenos cortes de 5 a 10 milímetros, o que oferece uma recuperação mais rápida e preserva melhor os vasos sanguíneos e os feixes nervosos da região, diminuindo os riscos de impotência sexual e de incontinência urinária.

Atenção à saúde como um todo

Nem só de atenção à saúde da próstata vive o Novembro azul. Doenças cardiovasculares, como o infarto do miocárdio, o acidente vascular cerebral (AVC) e a insuficiência cardíaca, estão entre as principais causas de morte no Brasil – e a sua maior incidência é entre os homens. De novo aqui o controle do peso é um fator importante para a prevenção, bem como cuidar com a pressão alta e evitar fumar. O tabaco, aliás, está relacionado a 90% dos casos de câncer de pulmão, uma doença que no país atinge duas vezes mais os homens do que as mulheres.

No urologista, é possível identificar outros problemas relacionados ao trato urinário e ao sistema reprodutor, como o câncer de pênis – relacionado com a higiene do órgão – e o de testículos – este último mais frequente em homens mais jovens, dos 15 aos 50 anos.

“Uma avaliação da saúde masculina deve ser realizada pelo urologista anualmente, não só para avaliar alterações da próstata, mas também tumores do trato urinário como dos rins e bexiga, tumores esses em que o diagnóstico precoce interfere diretamente na sobrevida dos pacientes”, finaliza Andrei Amatuzzi. 

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