Para diferenciar a mudança de humor do transtorno bipolar, deve ser observada a intensidade e frequência com que isso ocorre
Para diferenciar a mudança de humor do transtorno bipolar, deve ser observada a intensidade e frequência com que isso ocorre| Foto: Bigstock

“Em um momento está feliz, no outro está irritado. Ele deve ser bipolar”. Quantas vezes escutamos, ou mesmo dizemos, dos outros por nos depararmos com uma mudança repentina de humor. Contudo, apenas isso não é suficiente para caracterizar o transtorno de humor bipolar. Pelo contrário, levar na brincadeira uma patologia, aumenta o preconceito no tratamento.

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Para diferenciar a mudança de humor do transtorno bipolar, deve ser observada a intensidade e frequência com que isso ocorre. Além disso, a alteração de humor está acompanhada de mudanças comportamentais que fogem do que é o habitual da pessoa, trazendo inúmeros prejuízos.

Geralmente o transtorno se inicia em uma fase depressiva, e com o tempo pode evidenciar polos de euforia ou irritabilidade intensa e, em alguns casos, polos depressivos. Pode iniciar em qualquer época da vida, em especial no fim da adolescência e na vida adulta, trazendo infinitos prejuízos, até mesmo na vida acadêmica, ocupacional ou social.

Mas, ainda que segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), seja a sexta causa de incapacidade no mundo, devido ao preconceito e recusa no tratamento muitas pessoas não são diagnosticadas. Assim, o psiquiatra Glauber Higa Kaio, mestre em transtornos alimentares e vice-presidente da Associação Paranaense de Psiquiatria, compôs uma melodia no piano para conscientizar e ilustrar os desafios do acompanhamento e tratamento desta patologia.

Mas afinal, como é o comportamento de alguém com o transtorno bipolar?

Não existe um único padrão de comportamento daqueles que são diagnosticados com transtorno de humor bipolar, pois pode variar conforme os momentos de crise ou não, explica Deivid Regis dos Santos, psicólogo clínico e professor.

Quando está na fase depressiva, a pessoa pensa em desistir de tudo, achando que tudo vai dar errado, que não é boa o suficiente, que não tem nenhuma qualidade e que não vai atingir os objetivos. “É como se tudo estivesse nublado, num tempo ruim para ela. Aí ela acaba desistindo dos planos, das atividades da vida e não dando mais importância para as coisas que ela fazia. Até as atividades que ela gostava de fazer, já não trazem mais prazer”, destaca Higa Kaio.

Diferentemente, na fase de hipomania, a pessoa fica mais desinibida e pode apresentar algum comportamento impulsivo, que mais tarde leva ao arrependimento. Ela pode também apresentar episódios de irritabilidade, como se fosse uma pessoa explosiva, com “pavio curto”, ficando irritada de forma desproporcional ao estímulo, ao problema que aconteceu. “Mas nem sempre a pessoa percebe que está extrapolando ou que está acima do normal, pois geralmente a pessoa sempre foi assim ou conviveu com familiares que também agiram da mesma forma”, alerta o psiquiatra.

Qual o tempo de duração entre os episódios de humor?

Os episódios depressivos se intercalam com os episódios de euforia ou de irritabilidade em excesso. E, no meio deles, geralmente, ocorre uma fase em que a pessoa está com um humor considerado normal, esclarece Higa Kaio. “Se somado o tempo dos episódios, os depressivos duram, aproximadamente metade do tempo da vida, enquanto os de euforia em excesso ou de irritabilidade duram menos”, completa.

Além do mais, o psiquiatra conta que não há uma frequência estabelecida de tais episódios. “Enquanto uma pessoa pode apresentar pelo menos quatro episódios de humor ao ano, outras podem variar o humor em um curto período, como num único dia”, exemplifica. As pessoas também podem ficar muito tempo sem apresentar tais episódios, dependendo da gravidade do quadro clínico, do tipo de acompanhamento e da sua qualidade de vida, tranquiliza Santos.

Atenção para alguns sinais!

O transtorno bipolar, como todos os outros transtornos mentais, possui uma causa multifatorial: fatores biológicos, genéticos, alteração nos neurotransmissores, psicológicos e sociais. Porém, algumas características podem auxiliar no momento de buscar ajuda e investigar a possibilidade do diagnóstico de Transtorno Bipolar. Higa Kaio alerta para alguns sinais:

  • Episódios depressivos recorrentes;
  • Histórico familiar de transtorno bipolar;
  • Pessoa impulsiva, com prejuízos financeiros, profissionais, sociais, etc;
  • Comportamentos inadequados que trouxeram prejuízos como divórcio, demissão, “quebra” de sociedade, afastamento dos amigos ou familiares, problemas financeiros, etc;
  • Uso de álcool ou drogas;
  • Variação de humor constante, considerada como “meio de lua”, e
  • Ausência de melhora do quadro depressivo, mesmo com medicações.

Nos quadros de mania e hipomania, o paciente, geralmente, não consegue perceber que está com algum problema e é necessário que as pessoas à sua volta, principalmente a família, sinalizem o que está acontecendo, destaca Santos. “Por serem caracterizados com aumento da disposição, criatividade e coragem, acabam criando uma condição para que a pessoa queira manter esse episódio. Por isso, é muito difícil procurarem ajuda nesse período”, alerta o psicólogo.

É possível melhorar a qualidade de vida

Embora não tenha cura, o transtorno tem tratamento, destaca o psicólogo, que desenvolveu em seu mestrado uma pesquisa destinada ao tratamento de pessoas diagnosticadas com transtorno bipolar. O tratamento adequado basicamente é farmacológico e psicoterápico. Com a prescrição médica de um medicamento para estabilizar o humor, os picos, com altos e baixos de depressão e de euforia ou irritabilidade, tendem a diminuir.

A psicoterapia ajuda na melhora do quadro clínico e da qualidade de vida. As intervenções psicológicas ajudam os pacientes a se adaptarem à intervenção medicamentosa, entenderem melhor a doença, reduzir os fatores que mantêm e desenvolvem crises e a manejar as consequências prejudiciais dos momentos de mania e depressão.

Além disso, ter um sono regular e de boa qualidade é imprescindível, alerta o psiquiatra. “Nem sempre o quadro se estabiliza com a medicação, se a pessoa tem um sono ruim. Ter rotina para comer, dormir e tomar a medicação no horário certo é essencial”, diz. “É importante não ter vergonha em buscar tratamento, nem preconceito em relação ao uso de medicação prescrita pelo psiquiatra. Fazendo o tratamento correto, a pessoa consegue ter uma boa convivência em sociedade”, acrescenta Higa Kaio.

Por ser um transtorno crônico, como a hipertensão e diabetes, o tratamento precisa ser realizado por muitos anos. Assim, é possível alcançar o controle dos sintomas e a estabilização do quadro, evitando os prejuízos desnecessários na vida.

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