Projeto Inumeráveis foi criado no fim de abril e funciona como um memorial online para lembrar as vítimas da Covid-19
Projeto Inumeráveis foi criado no fim de abril e funciona como um memorial online para lembrar as vítimas da Covid-19| Foto: Reprodução/Inumeráveis

O projeto Inumeráveis parte da convicção de que os números não importam. Não dá para saber, por exemplo, quantos textos já foram publicados, quantos redatores estão envolvidos nesse trabalho ou quantas histórias cada um deles já contou. Lançada no fim do mês de abril, a plataforma – que funciona como um memorial online – lembra as vítimas fatais do coronavírus no Brasil e presta uma homenagem com depoimentos de pessoas próximas.

"Não há quem goste de ser um número. Gente merece existir em prosa", diz a biografia. Com instalação permanente até 2021, o site apresenta, de forma simples e poética, a identidade por trás da estatística: "Não era só dentista, era criadora de sorrisos. Ela espalhou amor por onde passou. Foi a melhor mãe, irmã, filha e avó do mundo. Sempre batalhou por tudo que conquistou e mesmo na situação mais adversa, quando estava no ápice da dor, não parou de sorrir. Sempre queria colocar um sorriso em todos à sua volta. Seus pacientes não eram só pacientes, eram amigos. Sua falta será sentida em todos os dias por aqueles que te amam infinitamente".

Edson Pavoni, um dos organizadores da iniciativa, afirma que a ideia sempre foi sensibilizar os leitores. "O desconforto de acordar todos os dias com um novo número de mortos, depois de um tempo, vai passando e a gente acaba ficando insensível. Já as histórias penetram no nosso coração em um lugar onde os números não conseguem chegar", declarou nas redes sociais.   

Os textos, carregados de recordações de parentes e amigos, também estão disponíveis na conta do memorial no Instagram. "No tecido da vida, ela bordava amor, luz e força. Os talentos de Adalgisa eram muitos e todos cintilavam o amor e o carinho que guardava no coração. Sua memória permanecia intacta e as histórias que contava sempre tinham grande riqueza de detalhes", expõe um deles.

Mão amiga

Para existir, o projeto colaborativo conta com a ajuda de voluntários espalhados por todas as regiões do país. Gente como a atriz Gabriela Veiga, de São Paulo, que dedica tempo para escrever sobre quem sequer conhecia. "Eu resolvi colaborar por um motivo muito específico: eu acredito que a arte tem um ofício de contar a história da Humanidade e é exatamente isso que o Inumeráveis está fazendo", diz.

Junto com a escritora Giovana Madalosso, ela é responsável, hoje, pela seção de obituários de vítimas indígenas da Covid-19. "Tem uma história que mexe muito comigo. É de um líder superior do povo Kokama, região do Alto Solimões, no Amazonas, que foi um dos primeiros a morrer", lembra.

Wirimi era líder dos guerreiros e ensinava outros índios a defenderem sua terra. Também colaborava na construção das ocas, diz o texto no site. "Ele era professor da língua que eles falam e se dedicou muito para que a cultura do povo não acabasse. Como os próprios kokamas dizem, sempre que um ancião morre, é como se um pedaço da memória fosse junto", conta Gabriela.

Para ela, "um memorial como esse é uma iniciativa que humaniza a forma fria, matemática e calculista como muitos lidam com a morte. Não são números que se vão, são universos inteiros", defende.

Recrutamento

No site, há uma ferramenta para "receber" interessados dispostos a colaborar. "Se você é jornalista, estudante, ou gosta de escrever, pode nos ajudar. Localize uma história perto de você, busque fontes, faça entrevistas, escreva e publique no memorial", orienta a plataforma.


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