Pense duas vezes antes de bradar suas virtudes – a ostentação moral é tóxica
| Foto: Jonas Leupe/Unsplash

Em uma era de partidarismos amargos, guerras políticas e ostracismos daqueles que têm pontos de vista menos populares, parece que existe um consenso: nos Estados Unidos, 85% das pessoas dizem que o discurso político se tornou pior nos últimos anos, de acordo com a Pew Research.

A polarização tem se manifestado por toda parte na sociedade, desde festas de família até conversas muito públicas nas mídias sociais, onde o debate é particularmente tóxico e agressivo.

Para psicólogos como eu, que estudam o comportamento humano, essa hostilidade generalizada é um problema social e uma oportunidade de pesquisa. Meus colegas e eu nos concentramos em um aspecto específico que pode ajudar a explicar o discurso disfuncional que vemos ao nosso redor: a atitude de vangloriar-se moralmente.

A pretensa superioridade moral

O termo pode não ser tão comum, mas muitas pessoas têm experimentado o que chamamos de ostentação moral. É o que acontece quando alguém faz afirmações grandiosas e intensas no Twitter sobre seus arraigados valores a respeito das mudanças climáticas ou quando um político em campanha levanta alegações ideológicas duras – mas claramente falsas – sobre imigração.

Essa expressão foi cunhada para descrever o uso abusivo das chamadas “conversas morais” – um termo guarda-chuva que engloba todas as conversas que temos sobre nossa política, crenças, valores e moral.

Geralmente, as pessoas se envolvem em conversas morais para aprender, se conectar ou persuadir alguém. Elas podem contar sobre sua decisão de não comer nenhum produto de origem animal, dizendo, por exemplo: “Sou vegano por motivos ambientais e de direitos dos animais”.

A ostentação moral ocorre quando as pessoas usam uma conversa moral para se promover ou buscar status. Assim, um ostentador moral pode dizer: “Sou vegano porque é a única decisão moral. Se você se importa com o planeta, não pode comer produtos de origem animal”. Para eles, a conversa é um meio para atingir um fim – não uma troca livre de ideias.

O desejo de ser respeitado por nossos pares é normal nos seres humanos, assim como os desejos de segurança, amor e pertencimento. Cientistas sociais até mesmo traçaram as origens evolucionárias do status, remontando-as ao período pré-histórico. A ostentação moral, no entanto, é um tipo especial de busca de status. Ela implica que alguém está usando conversas sobre tópicos importantes ou controversos apenas para chamar a atenção ou impressionar outras pessoas.

, assim como os desejos de segurança, amor e pertencimento. Cientistas sociais até mesmo traçaram as origens evolucionárias do status, remontando-as ao período pré-histórico. A ostentação moral, no entanto, é um tipo especial de busca de status. Ela implica que alguém está usando conversas sobre tópicos importantes ou controversos apenas para chamar a atenção ou impressionar outras pessoas.

Laços cortados e relacionamentos rompidos

Só porque uma pessoa exalta as próprias virtudes – seja no Twitter ou em uma conversa –, não significa que ela seja moralmente superior às outras. Em um estudo recentemente publicado, realizado com uma equipe de psicólogos e filósofos, fizemos a 6 mil pessoas uma série de perguntas sobre com quem e por que elas compartilham suas mais profundas crenças morais e políticas. As pessoas que relataram compartilhar crenças para ganhar respeito, admiração ou status foram identificadas como ostentadoras morais.

Quase todos os envolvidos indicaram que já passaram por um episódio pessoal de ostentação moral, mas apenas alguns – 2% a 5% – disseram que usavam conversas morais principalmente para se promover.

Descobrimos que os ostentadores morais eram mais propensos a experimentar discórdia em suas vidas pessoais. As pessoas que relataram mais ostentação moral também reportaram mais experiências de discussão com pessoas próximas e rompimento de laços com amigos ou familiares por divergências políticas ou morais.

Pessoas que indicaram usar suas crenças mais profundas para melhorar seu status na vida real também relataram comportamentos mais tóxicos nas redes sociais, brigando por política no Facebook, por exemplo, e repreendendo estranhos no Twitter por terem opiniões “erradas”.

Relatos filosóficos de ostentação moral sugerem fortemente que os ostentadores em geral se comportam moralmente pior do que outras pessoas. Eles são mais propensos a chamar rudemente a atenção dos outros por não serem suficientemente virtuosos, depreciar sistematicamente grupos inteiros de pessoas e desvirtuar conversas importantes de modo a servir a seus próprios propósitos.

Quando o desejo humano natural de respeito leva as pessoas a buscarem status em situações em que elas seriam mais beneficiadas se se colocassem à escuta, parece que esse comportamento pode separar amigos e familiares e dividir comunidades.

Outras razões para a discórdia

A ascensão da ostentação moral não é a única razão pela qual o discurso político se tornou pior. A política se desenvolveu de maneira extraordinariamente polarizada, o que é ao mesmo tempo uma causa e um efeito da polarização social. Pessoas politicamente ativas sentem mais animosidade e menos confiança em relação ao “outro lado” do que no passado.

As próprias mídias sociais parecem acelerar o conflito, criando câmaras de eco de pessoas que pensam parecidos que são blindadas contra os outros e conduzem a ciclos de indignação que aumentam rapidamente e sufocam a participação pública em conversas importantes. É por isso que abandonar a ostentação moral não corrigirá magicamente o debate público. Mas a reduzir levaria nossa situação a uma direção mais produtiva.

Como lidar com a ostentação moral

Avalie o seu próprio estilo de conversação, refletindo sobre o que você diz – e por que diz – aos outros. Ao entrar em território contencioso com alguém que diverge da sua opinião, pergunte-se se você está fazendo isso porque está realmente interessado em se comunicar e se conectar com seu colega de humanidade ou se está apenas tentando ganhar uma briga.

Pensar honestamente sobre o seu próprio envolvimento nas mídias sociais – o lugar em que mais nos vangloriamos de nós mesmos – é particularmente importante. Você posta material polêmico apenas para ter curtidas e retweets? Você compartilha conteúdos de pessoas com as quais você não concorda apenas para zombar delas publicamente? Você tenta superar as boas ações de alguém só para se exibir para pessoas cujo respeito você almeja?

Se sim, então você pode ser um ostentador moral. Caso contrário, você pode combater a ostentação moral, reconhecendo esses comportamentos nos outros e procurando dissuadi-los disso. Tudo o que um ostentador moral quer é status, respeito e estima – logo, privá-los da atenção que procuram é provavelmente a melhor forma de desencorajar esse comportamento.

*Professor de Psicologia na Bowling Green State University, nos Estados Unidos.

©2020 The Conversation. Publicado com permissão. Original em inglês.

Deixe sua opinião