Dona Terezinha é do tempo em que estudo era para poucos, mas hoje, aos 74 anos, escreve poemas e está preparando um livro.
Dona Terezinha é do tempo em que estudo era para poucos, mas hoje, aos 74 anos, escreve poemas e está preparando um livro.| Foto: Arquivo pessoal

Aos 74 anos, Dona Terezinha da Aparecida Almeida Pedroso é do tempo que estudo era para poucos. “Eu não cheguei nem a terminar o colegial”, lembra. Nascida em Guarapuava, região dos Campos Gerais do Paraná, se mudou, ainda moça, para o Rio de Janeiro, acompanhando uma “família de criação”. Na juventude, se casou com um gaúcho e passou a morar quase na fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai. A vinda para Curitiba foi a última parada, 30 anos atrás. “Tenho três filhas e três netos”, conta a aposentada.

O marido, companheiro de uma vida, “morreu do coração”, em 2007. De lá para cá, Dona Terezinha passou a se dedicar (quase que exclusivamente) à prática da fé e às ações sociais. “Eu sou franciscana e da Legião de Maria”, diz ela, revelando a longa devoção em São Francisco de Assis, Nossa Senhora das Graças e Nossa Senhora de Fátima – seus padroeiros.

Já na ala do voluntariado do Hospital Universitário Cajuru, onde “bate ponto” toda sexta-feira à tarde, a missão é visitar e ouvir pacientes internados e familiares. “Parece que escutar o que eles dizem dá ânimo para a gente. Eu amo esse trabalho”, afirma a voluntária com mais de 20 anos de experiência e uma das mais antigas a atuar no hospital.

Mas foi depois que o novo coronavírus começou a circular entre nós – e o isolamento se tornou necessário – que Dona Terezinha despertou para uma nova vocação: escrever. “Eu nunca tinha pegado uma caneta para escrever uma linha, você acredita?” declara. Fruto da nova paixão, ela já produziu mais de 40 poemas e está fazendo um livro sobre a própria história. “O livro já tem umas 30 páginas, mas tem uns pedações muito tristes. Aí eu vou para os contos, que me alegram mais”, explica.

Produção literária

Os textos em prosa envolvem acontecimentos da vida da idosa e cenas que ela presencia na casa da família em Nereidas, balneário de Guaratuba, no Litoral do Paraná, onde está passando a quarentena. “Eu estou aqui desde março. É um espaço grande, o 'Rancho do Gaudério', em homenagem ao meu marido. Eu fico observando os animais, cuidando do terreno e sempre tem uma inspiração diferente. Até uma minhoca que eu vi com umas formigas, esses dias, virou tema para um conto”, narra.

Depois de escritos à mão, é missão da filha de Dona Terezinha, Edina Almeida Pedroso, digitar os poemas no computador e enviar para as pessoas que acha que a mãe ia gostar que lessem. “Teve um que ela fez sobre os voluntários que atuam no Cajuru que eu já mandei para a coordenadora mostrar para eles”, descreve Edina. O texto se chama “Os golas laranja”, uma referência à cor do uniforme usado nas ações. Leia um trecho:

Entrei numa sala pequena com muitas pessoas para lá e para cá

Gente correndo com uma cadeira e pessoas a transportar

Usam avental gola laranja, pensei coisas estranhas acontecem lá

Vi também uma mesa cheia de bolos, gostosura igual não há

Fui me achegando a mesa e fui sentar, comi tudo que tinha lá e fui perguntar

Como que faço para nesta casa entrar?

Falou-me uma moça bondosa e só entrar naquele quarto e os ouvidos emprestar

Eles vão contar tudo o que ninguém quer escutar

Eles vão contar segredos que não posso revelar

Terminado a visita não precisa nem falar.

Outro poema, também enviado por Edina ao hospital, foi destinado aos médicos e profissionais da saúde, a quem Dona Terezinha chamou de “Os anjos de Deus” (veja abaixo). “Todos amaram”, resume a filha ao comentar a repercussão do trabalho da mãe.

São os profissionais da Saúde, eles chegam aos hospitais, sem tempo para voltar,

Cuidam de todos os doentes sem parar

Sem nem poder descansar

Quando chega a noite, eles a casa vão regressar

 Mas chegando lá não podem entrar

Pois a vida de seus familiares, eles têm que conserva

Pelo que garante a aposentada, cada poema que termina é motivo de orgulho e incentivo para começar outro. “Quando eu leio o que escrevi, fico até emocionada e penso: Meu Deus, fui eu que escrevi isso? Obrigada Senhor”, exalta.

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