A missão do Projeto Barnabé é "acolher o necessitado e promover a valorização dos mais vulneráveis".
A missão do Projeto Barnabé é “acolher o necessitado e promover a valorização dos mais vulneráveis”.| Foto: Projeto Barnabé

“O amor é vivo, ele anda, ele deve ser manifestado em qualquer lugar. E eu acho que esse lugar é onde tem um ser humano, independentemente do que ele tenha feito”. Para a pastora Desola Fenícia Barone, autora da frase, não há melhor correspondência ao mandamento cristão “amarás o teu próximo como a ti mesmo” do que um amor que se movimenta e se concretiza através de mãos que fazem, mãos que servem, mãos que ajudam aqueles que passam despercebidos.

E foi esse olhar atento aos mais necessitados que levou Desola e seu marido, o pastor e escritor Luiz Dias, a criarem o Projeto Barnabé. Tudo começou em 2014, quando a pastora reuniu alguns jovens para distribuir roupas, brinquedos e doces em bairros carentes. “Procurávamos um terreno baldio e saíamos convidando a comunidade para vir receber”, conta Desola. Depois, ela propôs ao marido que começassem a preparar um café para as pessoas em situação de rua. Em poucos meses, o café que servia cerca de cinco pessoas virou almoço semanal para mais de cem.

“Desse desejo de atender o próximo surgiu o nome. Barnabé é citado na Bíblia no começo da instituição da igreja primitiva. Ele vendeu tudo o que tinha e doou para atender os mais pobres”, explica a pastora. “E a nossa visão é de que tudo o que nós recebemos pode ser dividido”. E é assim, com um pão na mão para oferecer aos que têm fome, uma peça de roupa para os que não têm o que vestir, que Desola, seu esposo e dezenas de voluntários pregam o evangelho de Cristo. “Não preciso de púlpito”, afirma.

Ainda sem sede própria, o projeto, que em 2017 foi reconhecido como ONG, acontece nas dependências da Igreja do Evangelho Quadrangular em Fazenda Rio Grande, região metropolitana de Curitiba. Mas apesar da ligação com a igreja, a pastora afirma que a intenção é separar as coisas. “Muitos lugares fazem a pessoa passar pela igreja para ser atendida. Aqui não”, explica. “Embora tudo o que fazemos tenha base na doutrina cristã, a pessoa não precisa passar pela igreja. Visamos apenas o ser humano, independentemente daquilo que ele vai fazer com o que ele recebe”.

O amor em ação

O projeto tem portas abertas durante toda a semana, mas é nas quartas-feiras que a casa fica cheia e mais feliz. Às 8 horas, chegam os voluntários e prestadores de pena alternativa para se dividirem nos trabalhos. Enquanto alguns ajudam o pastor Luiz, cozinheiro oficial e responsável pela arrecadação de alimentos, outros ajudam na reciclagem das roupas recebidas de doação. Às 11 horas, as roupas são liberadas para as pessoas escolherem e levarem para casa. “Tem mães de família que vêm e pegam roupa para a família inteira. Quem tem filho sabe quanto custa uma peça de roupa”, comenta a pastora. Depois de recicladas, as roupas que não foram escolhidas são repassadas para outras instituições e escolas que fazem bazar. “No projeto nós não vendemos nada, um dos lemas é: recebe doação e repassa”.  

Paralelamente aos outros trabalhos da manhã, a barbearia também começa os seus atendimentos. Com pelo menos três barbeiros fixos ajudando no projeto, são realizados cerca de 30 cortes de cabelo e barba por quarta-feira. “A maior parte dessas pessoas não se olha mais no espelho, até o banho perdeu sentido para elas. Então, quando estou junto, peço para eles se olharem no espelho, falo que eles estão lindos, eles ficam numa felicidade!”. A equipe de voluntários também distribui kits com toalha, sabonete e shampoo para cada necessitado que chega.

Se o exterior de cada um é cuidado com tanto carinho, o interior também é. O momento de espiritualidade durante a manhã é sempre muito especial e a pastora explica o porquê. “Para a maioria deles, esse é o único momento que eles conseguem receber uma palavra espiritual, receber uma oração, porque eles não se encaixam em nossas igrejas. E quando falo isso, falo de igrejas em geral. Se um deles chegar na porta da igreja, já vai ser cerceado porque está embriagado, drogado, com uma tornozeleira ou cheirando mal”, observa Desola. “E nas quartas às 10h30, esse é um momento especial, não importa. O cheiro não é bom, entendeu? Às vezes é difícil de lidar com uma pessoa que está embriagada, drogada, mas para alguns deles essa é a última oportunidade”.

De acordo com a pastora, dos que passam pelo projeto, morrem entre cinco e sete no ano. “E para a maioria das pessoas é apenas mais um pobre que morreu, alguém que não vai ser dado nem importância”, lamenta.

E por fim, a hora do “evangelho da mesa”. E na mesa do projeto Barnabé tem lugar para todo mundo. “É o melhor lugar da casa, é onde a gente vê todo mundo reunido comendo uma comida digna. E para muitos deles é a única comida digna que eles têm na semana”, aponta a pastora. “O diferencial do projeto é estar com a pessoa, é ouvi-la. Um prato de comida não muda ninguém, mas ajuda a viver mais um dia. Um corte de cabelo não transforma a pessoa, mas proporciona um momento de bem-estar”.

Mãos que servem

Voluntária do projeto há seis anos, a vigilante Denise dos Santos Santana aproveita seus dias de folga para fazer o que estiver em seu alcance em favor dos mais necessitados. “Posso garantir que a felicidade maior sempre é minha em poder ajudar de alguma forma essas pessoas que já sofrem tanto e que muitas vezes só precisam de uma palavra, um abraço e atenção”, afirma Denise. “É muito gratificante e não pretendo parar”.

Segundo Desola, os voluntários aparecem de todos os lugares. São jovens que estão na faculdade e aproveitam as horas vagas, trabalhadores que usam os seus dias de folga, pessoas que ficam sabendo pela internet e simplesmente se oferecem para ajudar. São as mãos dessas pessoas que estão em um movimento de amor fazendo tudo isso acontecer.

O amor não se isola

Mesmo com a situação do isolamento social por causa da pandemia do novo coronavírus, os atendimentos do projeto não pararam, afinal “o amor não se isola”, como bem lembra Desola. As refeições continuam sendo distribuídas, só que agora em marmitas entregues na frente do portão. “Continuamos com a comida porque ninguém para de comer. E agora, estamos voltando com os banhos, muito devagar, porque tem que chamar um por um para entrar. As roupas eu mesma estou separando e começando a liberar para as mães”.  

Agora, resta seguir com o trabalho e sonhar com um futuro em que cada vez mais pessoas em situação de vulnerabilidade possam ser recebidas e atendidas por tantas mãos que amam através do seu serviço. Ampliar os dias de atendimento, ter a própria sede e um carro próprio estão entre os próximos passos que ajudarão o projeto a continuar fazendo a diferença na vida de tantas pessoas.

“As pessoas perguntam para mim: ‘ah, mas você acredita que essas pessoas mudam?’ e eu respondo: ‘se elas não mudarem, eu mudo cada vez que eu ajudo’. Sem muita expectativa, porque esse trabalho não tem recompensa, essas pessoas não podem te recompensar. Você só tem que fazer a sua parte”.

Se você quer se tornar um voluntário do projeto, ajudando presencialmente ou de outra maneira, este é o e-mail para contato: barnabeprojeto@gmail.com

Confira o vídeo institucional do projeto:

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