O coronavírus já matou mais de um milhão de pessoas em todo o mundo. Especialistas falam sobre como podemos sair dessa crise
Voluntários com equipamentos de proteção contra o novo coronavírus em um centro com unidades de quarentena em Yangon, Mianmar| Foto: Ye Aung THU / AFP

O número de mortos pelo novo coronavírus passou de um milhão em todo o mundo no início desta terça-feira (29), segundo a contagem da Universidade Johns Hopkins. Menos de um ano após a detecção do vírus na China, quase todos os países do globo perderam vidas para a Covid-19. Além das perdas humanas, economias estão sendo abaladas, milhões de crianças continuam fora das salas de aula e a vida cotidiana passou por grandes mudanças em todo o planeta. Entre os que sobreviveram à doença, muitos enfrentam consequências cujas gravidade e duração ainda são incertas.

Pouco mais da metade das mortes se concentra em quatro países: Estados Unidos (205 mil mortes), Brasil (142 mil), Índia (96 mil) e México (76 mil), nações que continuam lutando para controlar os contágios e ainda registram número alto de casos novos.

Mas a pandemia deixou ensinamentos até aqui e há alguns motivos para otimismo. Atualmente há um maior entendimento sobre como prevenir e tratar a doença, e isso tem salvado vidas. As chances de uma pessoa infectada pelo Sars-CoV-2 hoje são melhores do que as de meses atrás. Em todo o mundo, parece estar havendo diminuição da letalidade (a taxa de morte entre os infectados) da Covid-19, mesmo entre casos graves.

"Isso é reflexo do aprendizado do chamado manejo clínico, que é a atenção do paciente no ambiente hospitalar", diz Marcelo Gomes, pesquisador da Fiocruz e coordenador do InfoGripe. "Mesmo que ainda não tenhamos um medicamento específico para combater o vírus, houve avanço no cuidado com os efeitos do vírus no organismo. O atendimento ao paciente hospitalizado evoluiu muito."

Hoje os médicos sabem que o tratamento com alguns esteroides pode ajudar pacientes internados que precisam de respiração mecânica. Um medicamento antiviral pode acelerar a recuperação de pacientes que estão em estado grave no hospital. Há ainda os testes para o tratamento com plasma de pessoas que se recuperaram da Covid-19, que embora ainda não tenham dado resultados conclusivos, parecem promissores.

Além disso, os médicos têm hoje um entendimento melhor sobre a segurança dos procedimentos de oxigenação para os pacientes com insuficiência respiratória e podem tomar melhores decisões.

Outro aspecto que contribui para a redução da letalidade é que, em várias regiões, uma primeira onda muito forte pode ter atingido os mais vulneráveis em maior proporção. Agora, a retomada dos casos tem afetado mais a população mais jovem, que tem menos riscos de sofrer quadros mais graves da doença. Esse é o caso de partes da Europa que estão passando por uma segunda onda.

De maneira geral, os países têm feito mais testes e identificado casos que antes não eram detectados, e isso também tem o efeito de diminuir o número da letalidade.

Como podemos sair da crise

A maioria dos estados brasileiros tem mantido a tendência de queda no número de novos casos semanais de Covid-19, diz Gomes. Em outros locais, o número pelo menos não voltou a crescer. "Isso indica que o que fizemos, as ações que tomamos de distanciamento tiveram impacto e estão ajudando", avalia Gomes.

A chave para a saída dessa crise de saúde estaria em analisar constantemente a situação da epidemia para apertar ou afrouxar as ações de distanciamento social conforme o necessário. Para o especialista, à medida que a capacidade de atendimento hospitalar não esteja mais sobrecarregada e que o número de casos esteja diminuindo, é possível dar pequenos passos e tomar ações mais flexíveis. "Podemos dar o primeiro passo sempre lembrando que ele terá que ser avaliado constantemente, porque podemos ter que dar um passo para trás".

"O Brasil vai se sair tão melhor ou tão mais rápido dessa crise quanto melhor fortalecer os seus sistemas públicos", opina Mariur Gomes Beghetto, epidemiologista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Para a epidemiologista, a pandemia deixa clara a dificuldade das pessoas de ficar muito tempo em afastamento físico, e talvez seja por isso que elas acabam quebrando os procedimentos seguros, mesmo sabendo que isso as coloca em risco de contrair a doença. "Introduzir comportamentos novos tão rapidamente não está se mostrando como uma tarefa fácil", aponta.

Como minimizar riscos

Se nós somos uma espécie coletiva, que já está sofrendo com os prolongados meses de distanciamento físico, é natural que as pessoas estejam buscando formas de se encontrar. Há formas de fazer isso minimizando os riscos de transmissão do coronavírus, seguindo as recomendações que vêm sendo repetidas nos últimos meses: higienização das mãos, uso de máscaras, distanciamento social e ventilação.

O uso de máscaras continua sendo fundamental, especialmente em ambientes fechados. Evitar contato físico: abraço, aperto de mão e beijo de cumprimento são ações que aumentam os riscos de contrair ou de transmitir o vírus. Também é recomendado dar preferência a locais abertos e bem ventilados. "É temporário", lembra Gomes. "É algo que se a gente fizer bem feito, consegue retomar mais cedo o padrão anterior à pandemia".

Os especialistas lembram também que, embora o risco de desenvolver sintomas graves de Covid-19 seja menor para os jovens, eles podem transmitir a doença a pessoas que têm maior risco para quadros graves e de morte. Por isso, a decisão de aumentar as interações sociais deve levar em conta também o impacto sobre a coletividade.

"Nós vamos sair dessa com aquilo que já aprendemos. Para voltarmos mais rápido a socializar de um jeito parecido com o que tínhamos, precisamos adotar alguns comportamentos: higiene de mãos, uso de máscaras e distanciamento físico", diz Mariur, ressaltando que é compreensível que em lugares onde faltam água, esgoto e espaço, é difícil adotar essas medidas. "Mas não é compreensível que em um bairro nobre isso não aconteça".

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