Estudo mostrou que um treinamento com cheiros pode ajudar na recuperação de quem perdeu o olfato por causa da Covid-19.
Perda ou distorções no olfato são sintomas comuns entre pessoas infectadas pelo novo coronavírus.| Foto: Bigstock

Um dos sintomas mais típicos da Covid-19 é a perda de olfato, que frequentemente dura por um longo período após a infecção. A boa notícia para os pacientes preocupados em saber quando voltarão a sentir cheiros normalmente é que um estudo recente mostrou que um "treinamento com cheiros" pode ajudar a acelerar essa recuperação.

A perda de capacidade de sentir cheiros é um sintoma muito comum de doenças respiratórias infecciosas em geral, diz Matheus de Castro Fonseca, pesquisador de neurobiologia no Laboratório Nacional de Biociências da Unicamp. "No caso da Covid-19, o vírus é capaz de infectar as células do epitélio nasal – sejam elas neuronais ou não. A célula infectada tende a morrer. Então o vírus vai se multiplicando, os neurônios morrem e a pessoa perde a capacidade de sentir cheiro", explica o especialista, que lembra que hoje já se sabe que mesmo os neurônios do epitélio nasal podem se regenerar após lesões.

As células responsáveis pela sensação de cheiro são as células neuronais do epitélio nasal, que ficam no topo da cavidade nasal. Cada uma delas detecta uma molécula de odor específica.

Estudos anteriores dizem que mais de três quartos dos infectados pelo novo coronavírus perdem o olfato parcial ou totalmente (a chamada anosmia), independentemente da gravidade dos outros sintomas. Além da falta do sentido de cheiro e gosto, muitas pessoas relatam distorções no olfato que às vezes continuam por semanas ou meses depois da Covid-19 – o sintoma chamado parosmia. Esses pacientes passam a sentir o cheiro de coisas familiares de forma diferente ou mesmo têm a impressão de estarem cheirando algo que não está lá, como fumaça.

"Para pessoas com parosmia, o cheiro de certas coisas – ou às vezes de todas as coisas – é diferente, e muitas vezes desagradável", disse em comunicado à imprensa Carl Philpott, pesquisador da Universidade de East Anglia (Reino Unido) e um dos autores do estudo sobre o treinamento de olfato publicado recentemente. "Por exemplo, alguém com parosmia pode cheirar um pedaço de canela, mas para essa pessoa esse cheiro é horrível, como comida estragada ou algo pior".

A terapia pode ajudar pessoas que sofrem com distorções do olfato causadas por infecções virais ou por outros motivos, segundo o estudo, que foi publicado no periódico Laryngoscope por pesquisadores da Alemanha, Reino Unido e Polônia. "[O treinamento] surge como uma opção de tratamento simples e livre de efeitos colaterais para várias causas de perda de olfato. O objetivo é ajudar a recuperação com base na neuroplasticidade – a capacidade do cérebro de se reorganizar para compensar uma mudança ou lesão", explica Philpott.

A pesquisa começou antes da pandemia de Covid-19, então os participantes não tinham a doença, mas os pesquisadores dizem que as descobertas são úteis também para quem perdeu o olfato por causa do coronavírus. A terapia descrita no artigo consiste em cheirar quatro odores diferentes duas vezes por dia por 15 segundos cada um, durante alguns meses. Os participantes receberam combinações de substâncias com diferentes cheiros, como eucaliptol, citronela, canela, café, chocolate, mel, tomilho e lavanda. Eles então foram testados para saber como estavam percebendo esses odores no começo do estudo e seis meses após o treinamento.

Os pesquisadores concluíram que o treinamento com cheiros pode ajudar na regeneração das vias olfatórias. "Nós também descobrimos que pessoas mais velhas tinham mais chances de recuperar o seu senso de olfato. E que as maiores melhoras ocorreram entre aqueles que tinham perdido mais da sua função olfatória no início", relata Philpot.

Essa melhora nos sintomas ocorre pela plasticidade do cérebro, ou seja, a sua capacidade de formar novas conexões. "A pessoa vai sentir cheiros e isso leva à regeneração do epitélio nasal e gera conexões novas entre o nervo olfatório com outras regiões do cérebro", explica Fonseca.

Treinamento em casa

Pessoas que foram infectadas pelo coronavírus e ainda não recuperaram a capacidade de sentir cheiros podem tentar fazer um treinamento semelhante em casa, segundo Fonseca, já que o método teve sucesso e sentir cheiros não traz riscos para o pacientes. "As pessoas em casa não devem conseguir fazer o protocolo exato, mas esse treinamento pode também servir como indicador da melhora do olfato".

Ele recomenda que as pessoas testem o seu olfato diariamente com coisas como pó de café, frutas cítricas, mel e vinagre. "É bem possível que ocorra a transição entre não sentir cheiro, sentir cheiro errado e depois sentir o cheiro certo. A melhora dos sintomas olfatórios está acontecendo em 20 a 90 dias depois da infecção, dependendo da gravidade da lesão no epitélio olfatório".

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