Especialistas calculam que no mínimo 60% de uma população precisaria estar imune ao novo coronavírus para frear um surto da doença
Especialistas calculam que no mínimo 60% de uma população precisaria estar imune ao novo coronavírus para frear um surto da doença| Foto: Cameron Casey/Pexels

Um estudo em escala nacional descobriu que apenas 5,2% da população da Espanha, um dos países mais afetados pela pandemia na Europa, desenvolveu anticorpos para o novo coronavírus até o momento.

Os resultados, publicados nesta segunda-feira (6) no periódico científico Lancet, reforçam as evidências de que a imunidade coletiva para o novo coronavírus é "muito difícil de ser atingida", já que mesmo nas áreas mais atingidas da Espanha, a proporção de pessoas com anticorpos para a doença ficou em torno de 10%.

A imunidade coletiva, também chamada de imunidade de rebanho, é alcançada quando um número suficiente de pessoas em uma população está imune a um patógeno, porque foram infectadas ou vacinadas, para que a circulação desse vírus ou bactéria seja interrompida. Especialistas calculam que no mínimo 60% de uma população precisaria estar imune ao novo coronavírus para frear um surto da doença.

"Atualmente, a imunidade de rebanho é difícil de ser alcançada sem aceitar o dano colateral de muitas mortes na população suscetível e sobrecarregar os sistemas de saúde", dizem os autores da pesquisa espanhola. A Espanha registrou, até esta segunda-feira (6), 28.388 mortes por Covid-19, entre 251.789 infectados, segundo o monitoramento da Universidade Johns Hopkins. Oficialmente, 150.376 pacientes se recuperaram da doença no país.

O país europeu está em quinto lugar no ranking de mortes em relação à sua população, com 652 mortes por milhão de habitantes. Para comparação, o Brasil ocupa o 15º lugar dessa lista, com 308 óbitos por milhão de habitantes. Cerca de 95% dos espanhóis continuam suscetíveis ao novo coronavírus, de acordo com as conclusões do experimento.

Os resultados

O estudo na Espanha, coordenado por agências governamentais de saúde, foi feito entre 27 de abril e 11 de maio e teve três fases. Nesse período, mais de 61 mil pessoas selecionadas aleatoriamente em todo o país responderam a um questionário sobre o seu histórico de sintomas compatíveis com a Covid-19 e fizeram testes de detecção de anticorpos para a doença.

Na primeira fase, conduzida em meio ao rígido lockdown imposto no país, os pesquisadores viram que 5% da população tinham anticorpos contra o SARS-CoV-2, vírus causador da Covid-19. Na segunda rodada de testes, 5,2% dos cidadãos haviam contraído o vírus e produzido anticorpos.

Os resultados divulgados nesta segunda-feira são da terceira e última fase do estudo e mostram que a prevalência da imunidade se manteve em 5,2% da população. Houve diferenças regionais no estudo, que observou que mais de 10% dos habitantes da região metropolitana de Madri tinham anticorpos, enquanto menos de 3% dos moradores de regiões costeiras testaram positivo.

A pesquisa também indica que a imunidade contra o vírus causador da Covid-19 pode ter vida curta, já que 14% das pessoas que tiveram resultado positivo para anticorpos na primeira fase testaram negativo na última etapa dos testes. Essa perda da imunidade foi mais comum entre aqueles que não apresentaram sintomas da doença.

Longe da imunidade coletiva

Enquanto uma vacina segura e eficaz contra a Covid-19 não está disponível, havia alguma esperança de que a imunidade coletiva pudesse eventualmente proteger populações contra a doença. Mas os resultados da pesquisa espanhola contrariam essas expectativas e se somam a outros de estudos similares feitos na China, nos Estados Unidos e em outros lugares.

Também nesta segunda-feira, o Lancet publicou as conclusões de um estudo de anticorpos feito em Genebra, Suíça, com 2.766 participantes. Os testes feitos entre 6 de abril e 9 de maio revelaram que 4,8% da população tinha anticorpos contra o coronavírus na primeira semana de testes. A estimativa aumentou para 10,8% na última semana dos exames na cidade, a mais afetada pela pandemia na Suíça.

Em um artigo publicado no Lancet com comentários sobre as pesquisas da Espanha e da Suíça, especialistas suíços destacam que a principal descoberta das duas análises é que "a maioria da população parece não ter sido exposta ao SARS-CoV-2, mesmo em áreas com ampla circulação do vírus".

A conclusão é similar em lugares que não adotaram medidas mais rígidas de isolamento, como a Suécia, que relatou 7,3% da população com imunidade ao vírus no final de abril. "À luz dessas descobertas, qualquer proposta de abordagem para alcançar a imunidade de rebanho através de infecções naturais não é apenas antiética, mas também inatingível", destacam os autores do comentário no Lancet, Isabella Eckerle, diretora do Centro para Doenças Virais Emergentes de Genebra, e Benjamin Meyer, virologista da Universidade de Genebra.

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