Anvisa recomenda a suspensão da vacinação de grávidas com o imunizante da farmacêutica AstraZeneca/Oxford.
Anvisa recomenda a suspensão da vacinação de grávidas com o imunizante da farmacêutica AstraZeneca/Oxford.| Foto: Bigstock

Por recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a vacinação de grávidas com o imunizante da farmacêutica AstraZeneca e da Universidade de Oxford foi suspensa no país. Em nota técnica, a agência orienta que o Programa Nacional de Imunização (PNI) siga as indicações da bula da vacina, nas quais não constam o uso nesse público específico.

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A suspensão, de acordo com a agência, seria resultado "do monitoramento de eventos adversos feito de forma constante sobre as vacinas contra Covid em uso no país". A Anvisa não detalha, porém, quais eventos motivaram a recomendação. O Ministério da Saúde investiga o caso de uma gestante no Rio de Janeiro, imunizada com a vacina da AstraZeneca, que acabou morrendo.

"O uso off label de vacinas, ou seja, em situações não previstas na bula, só deve ser feito mediante avaliação individual por um profissional de saúde que considere os riscos e benefícios da vacina para a paciente. A bula atual da vacina contra Covid da AstraZeneca não recomenda o uso da vacina por gestantes sem orientação médica", destaca a Anvisa.

Na noite desta terça-feira (11), o Ministério da Saúde se manifestou e anunciou que a vacinação contra a Covid-19 será novamente restrita às gestantes com comorbidades, e as vacinas que serão aplicadas serão apenas a Coronavac, da Sinovac/Instituto Butantan, e o imunizante da Pfizer/BioNTech. Essa determinação valerá até que as análises de um caso raro de morte de uma gestante sejam concluídas.

"Reação" da vacina?

Não há, até o momento, nenhuma comprovação de que a vacina possa causar algum dano às gestantes ou aos bebês, segundo Somaia Reda, médica, coordenadora da maternidade do Hospital do Trabalhador, em Curitiba, e professora da Universidade Positivo. "Não temos análise que comprove que a causa da morte da gestante foi a vacina. A gente desconfia que possa ser a vacina, mas não há essa certeza. Há uma coincidência, mas não há certeza", explica a especialista.

Em caso de dúvidas, suspender o uso até obter a conclusão é a atitude mais indicada pelos especialistas – especialmente porque há outras vacinas aprovadas no país para atender esse público. O imunizante da Pfizer/BioNTech, por exemplo, que chegou recentemente ao Brasil, está sendo avaliado em um estudo clínico com gestantes, iniciado em fevereiro.

Resultados preliminares de outra pesquisa que avaliou a segurança das vacinas de tipo RNA mensageiro – que é o caso da Pfizer/BioNTech e da Moderna – mostraram que não foram observados sinais de alerta entre as grávidas. Os dados foram publicados na revista científica The New England Journal of Medicine.

"O que nós recomendamos: neste momento, está suspensa a vacinação e aguardamos o Ministério da Saúde se posicionar sobre as outras vacinas. No caso da gestante que já tomou a primeira dose da AstraZeneca, a princípio é só monitorar e, qualquer coisa diferente, procurar o médico obstetra. Nesse momento, a orientação é não tomar a segunda dose", explica Agnaldo Lopes, médico ginecologista, presidente da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e professor da Universidade Federal de Minas Gerais.

Como a vacinação das gestantes começou nesta semana em todo o país, espera-se que novas orientações cheguem antes da aplicação da segunda dose. O intervalo entre as aplicações, no caso da vacina da AstraZeneca/Oxford, é de 12 semanas.

Riscos raros de trombose

Um dos principais receios ao se falar em vacinas para gestantes é com relação ao tipo que será aplicado. Imunizantes que usam o vírus "vivo", porém atenuado, como a vacina da febre amarela, não são indicados às grávidas, pois há o risco de gerar a infecção.

Isso porque o sistema imunológico também fica "atenuado" durante o período da gestação. Esse é o motivo também pelo qual as gestantes têm maior risco de infecções mais graves, como a gripe e a Covid-19.

No caso das vacinas anticovídicas disponíveis no Brasil, nenhuma usa o vírus na sua forma atenuada:

  • A Coronavac, do laboratório chinês Sinovac usa o vírus inativado, ou "morto";
  • A vacina da Pfizer/BioNTech usa apenas um filamento de RNA mensageiro do coronavírus, incapaz de gerar a doença;
  • A vacina da AstraZeneca/Oxford usa outro vírus, um adenovírus (causador do resfriado comum em chimpanzés), para carregar uma informação genética do coronavírus. Nenhum deles está "vivo" ou "atenuado".

No caso da vacina da AstraZeneca/Oxford, outro fator de discussão é com relação ao risco de trombose. No início de abril, a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) confirmou uma "possível associação" entre o imunizante e casos raros de coágulos sanguíneos. Calcula-se cerca de seis casos de trombose identificados a cada um milhão de vacinados, o que representa 0,0006% no risco.

Além de raro, os especialistas destacam que um risco ainda maior de trombose está vinculado à própria Covid-19. "Pacientes com Covid-19 têm quase 17% de risco de ter trombose", cita Luiza Sviesk Sprung, médica ginecologista e obstetra e professora da PUCPR. 

Embora as gestantes também tenham um risco aumentado para trombose pela gravidez em si – cerca de um a dois casos por mil gestantes –, os riscos não se somariam de uma forma cumulativa como o senso comum imagina. "Não seria o dobro de chance de trombose em uma gestante que se vacine, não é assim que funciona. É algo mais para ficar atento do que para contraindicar", destaca.

"A orientação da Anvisa foi de paralisar a vacinação para ter certeza que foi um evento adverso não ligado à vacina, já que tem outras duas vacinas que são categorias B para a gestação", afirma a especialista.

Medicamentos ou vacinas que entram na categoria B são aqueles que, na balança entre riscos e benefícios, o uso não está associado a efeitos adversos e que, possivelmente, há resultados de testes em gestantes. "A vacina da AstraZeneca hoje é categoria C. Então, se não tiver outra opção, coloca-se na balança. Se não é uma gestante que está exposta ao público ou que tem algum fator de risco, é melhor segurar um pouco. Mas como temos opções, outras vacinas podem ser aplicadas", explica Sprung.

Já me vacinei, e agora?

Caso tenha recebido a primeira dose da vacina da AstraZeneca/Oxford, a orientação da média pediatra Flavia Bravo, que também faz parte da diretoria da Sociedade Brasileira de Imunizações, é para que se tenha tranquilidade.

"Vigiem os sintomas, procurem seus médicos caso tenham algum sintoma suspeito nas primeiras semanas após a vacinação. Apesar de terem sido poucos os casos de tromboembolismo após a vacina, e não estarem relacionados às gestantes, a maior parte aconteceu em torno de duas a três semanas após a aplicação. Mas, de modo geral, podem ter dor no local e febre, que aparecem em poucos dias", cita a especialista.

Ainda segundo Bravo, as gestantes devem aguardar por mais informações, que chegarão nos próximos dias. "Estamos lidando com uma vacina nova, com uma informação nova que não foi ainda adequadamente depurada e explicada. E existe a vigilância, que está cuidando disso. Temos que aguardar o posicionamento do Programa Nacional de Imunizações, do Ministério da Saúde, para verificar e ter mais certeza", completa.

Puérperas

De acordo com o presidente da Febrasgo, as mesmas orientações para as gestantes servem também para as puérperas – 45 a 60 dias após o parto.

"A questão das puérperas é que não tem a transmissão para o feto, mas do ponto de vista de risco de trombose é o mesmo das gestantes. Isso porque a puérpera ainda mantém por um tempo as alterações fisiológicas da gestação", explica o médico.

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