Pesquisadores da Fiocruz detectaram seis linhagens do novo coronavírus circulando no Brasil no início da pandemia| Foto: Bigstock
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Pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) descobriram que pelo menos seis linhagens (ou cepas) do Sars-CoV-2, o vírus causador da Covid-19, circularam no Brasil nos primeiros meses da pandemia. O anúncio foi feito pela fundação na quarta-feira (15). Para chegar a essa conclusão, a equipe fez o sequenciamento genético de 95 amostras de pacientes infectados pelo vírus em todas as regiões do país.

A análise da diversidade genética das amostras, coletadas de pessoas de nove estados e do Distrito Federal, entre 29 de fevereiro e 28 de abril, revelou que o novo coronavírus teve múltiplas introduções no Brasil. Os resultados da pesquisa foram divulgados como "preprint" (artigo ainda sem revisão de outros especialistas) na plataforma bioRxiv. Uma dessas linhagens deve ter surgido na Europa por volta de 2 de fevereiro e chegado no Brasil algumas semanas depois, se propagando para várias regiões do país já em março.

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Todos os vírus sofrem mutações naturalmente, e o Sars-CoV-2 não é exceção. Cientistas analisam essas mutações para rastrear a propagação do vírus em países e regiões. Cada linhagem é composta por uma versão do vírus com pequenas variações genéticas em relação à sua forma original. A ocorrência de várias "formas" do vírus não significa que uma pessoa que foi infectada e se recuperou possa ser reinfectada por uma cepa diferente.

"A caracterização das linhagens virais permite compreender o tipo de vírus que está circulando em determinada região e realizar comparações acerca da circulação das linhagens entre os países e até mesmo dentro do país. É um passo importante para entender como a linhagem está se comportando e se dispersando em cada região geográfica", explicou Paola Cristina Resende, pesquisadora do Laboratório de Vírus Respiratórios e do Sarampo e coordenadora do estudo, em comunicado da Fiocruz.

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Vindo da Europa

Os pesquisadores detectaram a circulação de seis linhagens do Sars-CoV-2: A.2, B.1, B.1.1, B.2.1, B.2.2 e B.6. A maior parte das sequências do estudo foi classificada como do clade (grupo) B.1, com predominância do subclade (subgrupo) B.1.1. "O clade B.1.1 foi a única linhagem detectada em indivíduos sem histórico recente de viagem internacional, enquanto quatro linhagens diferentes foram detectadas entre os seis indivíduos com histórico recente de viagem internacional, ou seja, casos importados, e seus contatos", disse a pesquisadora.

Para investigar a trajetória dessa linhagem prevalente no Brasil, os especialistas fizeram uma análise filogenética, uma espécie de "árvore genealógica" do vírus, comparando as 87 amostras brasileiros que pertencem ao grupo B.1.1 a 3.764 genomas do novo coronavírus, disponíveis em um banco de dados e que representam a diversidade global do vírus.

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Essa linhagem, que parece ter sido responsável por grande parte das transmissões comunitárias no Brasil, foi chamada pelos pesquisadores de B.1.1.BR. Ela passou por duas mutações que causaram a substituição de aminoácidos na estrutura do vírus. Esse estudo não analisou se as mutações tiveram impacto na forma como o vírus é transmitido ou na sua capacidade de infecção.

As análises indicam que, muito provavelmente, uma linhagem intermediária entre a B.1.1 e a B.1.1.BR surgiu por volta de 2 de fevereiro na Europa e chegou ao Brasil algumas semanas depois, se espalhando rapidamente para várias regiões brasileiras já na metade de março. Ainda, essa cepa teria sido "exportada" para outros países antes da implementação das medidas de restrição de voos no Brasil – essa linhagem foi encontrada em vizinhos sul-americanos, como Argentina, Chile e Uruguai, e em outros países mais distantes, incluindo Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e Austrália.

O primeiro caso positivo para Covid-19 no Brasil foi registrado em 26 de fevereiro de 2020, um homem que viajou da Europa para a região metropolitana de São Paulo. Nas duas semanas seguintes, o vírus já havia sido detectado em todas as regiões brasileiras.