Onze por cento da população relatou ter depressão, enquanto 9,1% alega ter diabetes, doença crônica até então mais comum no pais
Onze por cento da população relatou ter depressão, enquanto 9,1% alega ter diabetes, doença crônica até então mais comum no pais.| Foto: Gadiel Lazcano/Unsplash

Pela primeira vez a pesquisa Vigitel, do Ministério da Saúde, apresentou números sobre depressão e constatou que 11,3% dos brasileiros sofrem com a doença. O número está acima da média indicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para o país, que foi de 5,3%.

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Realizado anualmente, o levantamento feito por telefone constatou, ainda, que a depressão superou a diabetes, doença crônica comum entre os brasileiros. Apensas 9,1% dos entrevistados relataram sofrer dela.

O que explica o número de depressivos diagnosticados no país, de acordo com a psicóloga e psicanalista Juliana Santos, são os padrões associados pelos indivíduos ao que se produz e consome. E isso somado, ainda, ao modelo de vida da contemporaneidade, inclusive ao transformar o sujeito em coisas, contribui para o aumento expressivo de casos de depressão.

“De um lado, a sociedade evoca igualdade a todos perante a lei, e por outro lado o sujeito cada vez mais reivindica a sua singularidade, se opondo a uma imagem universal. Desse modo, a subjetividade vem sendo substituída pela individualidade, com a falsa ilusão de liberdade. Isso resulta na perda de referências socioculturais, levando o sujeito a vivenciar um real desamparo”, explica a professora de psicologia da Uninter.

O alto índice de depressão nos brasileiros se deve à pandemia?

O medo em relação a uma doença nova, o luto de pessoas que tiveram familiares acometidos pela Covid-19. Também, as dificuldades financeiras e prejuízos profissionais que muitos vivenciaram ao longo dos últimos dois anos, o impacto na qualidade de vida com aumento do sedentarismo e nível de estresse emocional são impactos na rotina causados pela pandemia que podem ter aumentado expressivamente os quadros de transtornos emocionais, inclusive depressão, acredita o psiquiatra Guilherme Pereira da Costa Gois, médico cooperado da Unimed.

Além disso, o hábito de prática de atividades físicas, momentos de lazer e conectividade social com amigos e familiares são fatores preventivos para o surgimento de doenças, inclusive da depressão. Contudo, foram impedidos durante o período de isolamento, afetando de forma significativa e aguda, os hábitos cotidianos das pessoas.

Somado a esses fatores, Juliana explica que a pandemia fez evidenciar o vazio do ser, ou seja, todos tiveram que parar, de forma súbita, e se confrontaram com suas escolhas, suas famílias, a profissão, o estilo de vida e tantas outras coisas que ninguém estava preparado para responder. “Nesse sentido podemos compreender o aumento de casos de depressão, pois passamos a vida inteira tentando escamotear a verdade do desamparo estrutural. Mas é nas contingências que ele retorna com toda violência sob o ser do sujeito”, esclarece a psicóloga.

Preconceito no diagnóstico

Gois explica que comumente são encontrados nos pacientes com depressão fatores como estresse, sobrecarga profissional, sedentarismo, sobrepeso, abuso de álcool e outras substâncias psicoativas. Acrescido a isso, Juliana acredita que os brasileiros têm uma barreira a ser superada no cuidado com a saúde mental, pois existe um preconceito muito grande em torno do sofrimento psíquico.

Para ela, o preconceito relaciona-se com um resquício histórico de sofrimento que a maioria do povo brasileiro já vivenciou. Por conta disso, muitas pessoas acreditam que a dor da alma, ou seja, o sofrimento psíquico, não pode ser sentida como tal, devendo ser silenciada, por entenderem que caracteriza fraqueza. “Devemos combater esse tipo de pensamentos que são gatilhos para acentuar mais ainda uma dor, pois acredito que não exista pior sofrimento que aquele que eu não me autorizo a sentir”, alerta a psicóloga.

Segundo Gois, a pandemia ajudou a reduzir em parte o preconceito enraizado na sociedade e parte do estigma que se tinha em falar sobre e buscar atendimento para doenças psiquiátricas. “Houve um aumento expressivo da busca por atendimentos psiquiátricos e psicológicos, facilitados também pelo acesso das modalidades de atendimento a distância (telemedicina), ferramenta de essencial importância principalmente nos momentos mais graves da pandemia e isolamento social”, complementa ele.

As mulheres estão mais depressivas do que os homens?

De acordo com a pesquisa, 14,7% das mulheres relataram o diagnóstico de depressão enquanto 7,3% dos homens disseram o mesmo. Mas estamos falando de um mal do século que tem atingido o mundo todo. Portanto, homens e mulheres então sujeitos na mesma proporção a sofrerem de depressão.

Contudo, a mulher, perante a sociedade, se permite falar mais sobre isso. Além disso, elas têm realmente maior incidência de quadros depressivos, o que em parte pode ser explicado por fatores hormonais, mas também pelo fato de a maioria das mulheres hoje em dia desempenharem múltiplas funções.

Alerta para o futuro

A depressão não precisa de um grande fator para surgir. Mesmo quando tudo aparenta estar bem, a pessoa pode sentir uma imensa tristeza que não consegue nominar, destaca Juliana. Além disso, alguns sintomas podem ser alerta para possível quadro depressivo, como:

  • Perda de vontade de estar com pessoas;
  • Alterações do humor;
  • Tristeza ou vontade de chorar sem aparente motivo;
  • Perda da vontade para situações anteriormente prazerosas;
  • Irritabilidade;
  • Alteração do padrão alimentar (aumento ou redução do apetite);
  • Insônia ou sono excessivo;
  • Perda da libido;
  • Queda do rendimento profissional ou acadêmico,
  • Abuso de álcool.

Na psicanálise, conta a psicóloga, a depressão está relacionada a uma perda de ideal, como se o mundo imagina pelo sujeito desabasse e, no seu lugar surge um imenso vazio. Assim, a depressão pode ser relacionada a um esvaziamento pelo qual nada mais faz sentido para o sujeito.

Gois orienta que ao observar a intensidade dos fatores acima, podendo ser acrescido o sofrimento e a dificuldade para manter as atividades cotidianas, mais rapidamente a pessoa deve buscar atendimento especializado com psiquiatra ou psicólogo. “O combate se dá por intervenções em melhorar o estilo de vida, e quando a situação se torna mais agressiva e com consequências claras para as rotinas da pessoa, deve se buscar atendimento especializado”, conclui o profissional.

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