Prêmio Nobel de Medicina 2020 foi concedido a três pesquisadores que descobriram o vírus da hepatite C, que gera danos ao fígado
Prêmio Nobel de Medicina 2020 foi concedido a três pesquisadores que descobriram o vírus da hepatite C, que gera danos ao fígado| Foto: Bigstock

Quem acompanhou a notícia desta segunda-feira (5) dos três pesquisadores que ganharam o prêmio Nobel em Medicina 2020 devido à descoberta do vírus da hepatite C pode ter se perguntado: o vírus já não era conhecido?

O causador da hepatite C é, sim, velho conhecido da comunidade médica e científica, visto que o sequenciamento genético do vírus (HCV, gênero Hepacivirus, família Flaviviridae) foi feito na década de 1980. Acontece que, como lembra Marciano Anghinoni, cirurgião oncológico membro da diretoria nacional da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), o impacto desse achado foi tão grande na saúde pública que, mesmo décadas depois, o prêmio foi merecedor. Os pesquisadores laureados foram os norte-americanos Harvey J. Alter e Charles M. Rice e o britânico Michael Houghton.

O especialista destaca que, pessoas que entram em contato com o vírus da hepatite C podem desenvolver uma versão crônica da doença que, aos poucos, prejudica o fígado. As lesões no órgão podem desencadear condições como a cirrose e até mesmo um tipo de câncer, o hepatocarcinoma.

"É um câncer agressivo, que muitas vezes requer o transplante do fígado. É considerado um dos cânceres mais mortais, um grande problema de saúde pública mundial. A importância dessa descoberta foi que, desde então, conseguimos evitar a transmissão do vírus e desenvolver medicações que evitem que a doença chegue a esse ponto", explica o especialista, que é também chefe do Serviço de Cirurgia Oncológica Digestiva da Unidade de Assistência de Alta Complexidade (UNACON) do Hospital São Vicente, em Curitiba.

O desenvolvimento dessas condições, no entanto, leva tempo. Cerca de 30 anos entre o primeiro contato e o diagnóstico de uma cirrose ou câncer, segundo Anghinoni. O problema é que, durante esse período, a pessoa pode não perceber que há um vírus lesionando o fígado.

"A descoberta desse vírus foi uma oportunidade de combater as doenças que ele causa. Com isso, foi possível desenvolver exames diagnósticos, com a testagem de amostras de sangue para que as pessoas não recebessem a transfusão com um sangue contaminado pela hepatite C", explica o médico, detalhando uma das vias de transmissão da doença.

Sinais de alerta e como prevenir

A hepatite C pode se manifestar de duas formas: aguda ou crônica. A segunda é a mais comum, de acordo com dados do Ministério da Saúde. Estima-se que entre 60% a 85% dos pacientes com a infecção se tornam crônicos. Destes, 20% evoluem para cirrose. Da cirrose, 1% a 5% desenvolvem o câncer do fígado.

Há pacientes que também podem ficar assintomáticos por muito tempo. Se a pessoa desenvolve um quadro agudo, alguns sintomas chamam atenção, como dor abdominal, febre, icterícia (coloração amarela de pele e olhos), diarreia, perda de peso e falta de ar. Mesmo quem tem uma resposta aguda, caso não tratada adequadamente, pode vir a desenvolver uma doença crônica no futuro, segundo Anghinoni.

Das vias de transmissão, a hepatite C se diferencia dos outros tipos (há 5: hepatite A, B, C, D e E). No caso da A, a transmissão é via alimentos. Na B é via sanguínea e relações sexuais. Já a C é quase exclusivamente por sangue e objetos contaminados que perfuram a pele, como agulhas e seringas. O Ministério da Saúde lista ainda:

  • Contato com sangue contaminado pelo compartilhamento de agulhas, seringas e outros objetos para uso de drogas;
  • Reutilização ou falha na esterilização dos equipamentos médicos ou odontológicos;
  • Falha na esterilização dos equipamentos usados por manicures;
  • Reutilização de material usado para tatuagens;
  • Procedimentos invasivos, como hemodiálise, cirurgias e transfusão de sangue sem os cuidados de biossegurança;
  • Uso do sangue e derivados contaminados;
  • Relações sexuais sem o uso de preservativos (menos comum);
  • Transmissão de mãe para filho durante gestação ou parto (menos comum).

A prevenção passa por evitar essas situações de risco listadas acima, visto que, para a hepatite C, não há vacina. "Não há vacina atualmente desenvolvida, e nem em fase de testes, para essa hepatite. Por isso a importância da conscientização em evitar a contaminação. A transmissão por transfusão de sangue não acontece mais, porque as amostras são todas testadas, mas as outras sim. E algumas pessoas podem permanecer assintomáticas, transmitindo sem saber", explica o especialista.

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