Cientistas em diversas partes do mundo ainda tentam entender como o novo coronavírus causa a inflamação do coração
Cientistas em diversas partes do mundo ainda tentam entender como o novo coronavírus causa a inflamação do coração| Foto: Bigstock

Inicialmente, a Covid-19 foi entendida como uma doença pulmonar. Logo ficou claro que se trata de uma enfermidade sistêmica, que ataca praticamente todos os órgãos e funções do corpo. Dados mais recentes têm mostrado que os danos mais graves do novo coronavírus podem ser ao coração.

A miocardite (inflamação do músculo cardíaco) associada à Covid-19 é um problema que muitos médicos começam a notar com mais frequência, mesmo em pacientes que não apresentaram um quadro grave e até entre assintomáticos. A miocardite não é uma condição necessariamente grave, mas, em alguns casos, pode levar à insuficiência cardíaca.

"As complicações cardiovasculares precisam ser vistas com atenção. O novo coronavírus pode afetar qualquer estrutura do coração, causando inflamação e trombose nos vasos e tecidos", alerta Evandro Tinoco Mesquita, presidente do Departamento de Insuficiência Cardíaca da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC).

"O vírus pode afetar o sistema cardiovascular com manifestações diversas, como injúria miocárdica, insuficiência cardíaca, arritmia, miocardite e choque", enumera a cardiologista Glaucia Moraes, coordenadora da SBC e do programa de Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio (UFRJ).

Dano comprovado

Um pequeno estudo feito na Alemanha e publicado na revista Jama Cardiology em julho mostra como o coronavírus afeta o coração. Os pesquisadores estudaram cem pessoas, com idade média de 49 anos, que se recuperaram da Covid-19. A maioria foi assintomática ou apresentou sintomas muito leves.

Cerca de dois meses depois do diagnóstico, os cientistas submeteram os pacientes já totalmente curados a exames de ressonância magnética e fizeram descobertas alarmantes: cerca de 80% deles apresentavam anomalias cardíacas e 60% tinham miocardite.

Outro estudo publicado também na Jama Cardiology apresentou número preocupante. Autópsias feitas em 39 pacientes que morreram de Covid-19 revelaram a presença do vírus no miocárdio em 60% dos casos.

Embora esses estudos sejam considerados pequenos e as conclusões não sejam ainda totalmente compreendidas, já está claro para os especialistas que é comum um paciente jovem, que aparentemente superou a Covid-19, apresentar algum problema cardíaco.

Cientistas em diversas partes do mundo ainda tentam entender como o novo coronavírus causa a miocardite. Não se sabe se é por um dano causado diretamente pelo vírus ao coração ou se decorre da violenta resposta imunológica do organismo causada pelo vírus. "Esse dano cardíaco é provavelmente multifatorial", aponta Glaucia Moraes. "Pode ser resultado do desequilíbrio entre a alta demanda de oxigênio e a baixa reserva cardíaca, a tempestade de citocinas, a inflamação sistêmica e a trombogênese. E também pode ser decorrente da lesão direta do vírus no coração."

Alguns especialistas defendem a ideia de que parte do sucesso de medicamentos imunossupressores no tratamento da Covid-19 seria, justamente, por causa do efeito positivo na prevenção de danos ao coração. Alguns desses remédios são usados para tratar a miocardite. Os médicos lembram que a cloroquina e azitromicina têm como efeito colateral problemas cardíacos, como arritmias e taquicardias.

Olhar completo

De acordo com Marcelo Rivas, coordenador de emergências médicas da Universidade do Estado do Rio (Uerj), o paciente da Covid-19 muitas vezes é examinado de forma muito rápida. "Há sempre um risco de o médico deixar passar alguma coisa", afirma o cardiologista. "Acho que a mensagem mais importante é que precisamos ter atenção ao sistema cardiovascular do paciente de Covid-19, auscultar, fazer eletro, dosar enzimas. A abordagem deve sem mais completa do que se fosse apenas uma doença pulmonar", completa.

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