Síndrome inflamatória que atingiu algumas crianças na Europa e Estados Unidos pode estar associada à Covid-19
Síndrome inflamatória que atingiu algumas crianças na Europa e Estados Unidos pode estar associada à Covid-19| Foto: Bigstock

Nos primeiros relatos sobre a infecção pelo novo coronavírus, o impacto da doença entre crianças e adolescentes parecia ser mínimo. Quando não eram assintomáticos, os sintomas eram leves. E, na maioria das vezes, ainda é assim.

Novas evidências, no entanto, têm feito médicos e especialistas ficarem atentos a alguns sinais que podem indicar uma situação mais grave. Crianças com febre alta e persistente, sintomas gastrointestinais, como diarreia e dores na barriga, além de uma vermelhidão pelo corpo devem chamar atenção dos pais para uma condição conhecida por síndrome inflamatória multissistêmica pediátrica. Confira abaixo os sinais de alerta.

No fim de abril, a Sociedade de Cuidado Intensivo Pediátrico do Reino Unido emitiu um alerta para o aumento no número de crianças com esse quadro. Parte delas havia testado positivo para a Covid-19. Uma semana depois, no dia 4 de maio, o departamento de saúde da cidade de Nova York, nos Estados Unidos, registrou a mesma condição em 15 crianças internadas nos hospitais da cidade. Até o dia 12 de maio, estima-se que 100 crianças norte-americanas tenham sido identificadas com essa mesma inflamação, possivelmente associada ao novo coronavírus.

Na China, o primeiro artigo científico a descrever os sintomas não-respiratórios da Covid-19 em crianças verificou que, em cinco pacientes, de 2 meses a 5 anos de idade, com sinais inflamatórios, todos haviam sido expostos ao novo coronavírus. E um estudo maior, realizado na Itália, e divulgado pela revista científica Lancet no último dia 13 de maio, percebeu um aumento de 30 vezes na incidência dos sintomas semelhantes à doença de Kawasaki no último mês.

Doença de Kawasaki e choque tóxico

Os sintomas que identificam a síndrome inflamatória multissistêmica são semelhantes a outras doenças pediátricas, como a de Kawasaki e o choque tóxico. Por serem raras, com incidência de cinco para cada 100 mil crianças no caso da Kawasaki, o aumento no número de pacientes com os mesmos sintomas acendeu o alerta de médicos na China, Espanha, Itália, além do Reino Unido e Estados Unidos – locais que já registraram a condição.

Não se trata, porém, de um desencadeamento dessas doenças a partir da infecção pelo novo coronavírus, conforme explicam os especialistas ouvidos pelo Sempre Família. Por terem características parecidas, essas outras condições precisam ser excluídas para o diagnóstico da síndrome inflamatória.

"O que eles viram foram crianças com sintomas semelhantes [às doenças raras e conhecidas], como febre persistente e algumas evidências de disfunção em mais de um órgão, principalmente o cardíaco. Os sinais poderiam preencher alguns dos critérios da doença de Kawasaki. Mas ainda não há muitas certezas", explica Eitan Berezin, médico pediatra, professor da Faculdade de Ciências Médicas e chefe do setor de infectologia pediátrica da Santa Casa, em São Paulo, além de servidor público do Hospital Emílio Ribas.

O especialista lembra ainda que não há o relato, por enquanto, de nenhum fator de risco que possa favorecer o quadro. "O que há de comparação de idade, até o momento, é que a Kawasaki cursa com crianças ao redor de 1 ano. Nessa nova doença, os pacientes costumam ter uma idade um pouco mais elevada, acima de 5 anos", completa o médico, que também faz parte do departamento científico de infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).

Síndrome inflamatória no Brasil?

Não há confirmações, por enquanto, desse tipo de cenário inflamatório nas crianças no Brasil. Mas, segundo Carolina Prando, médica imunologista e pediatra no Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, a síndrome pode chegar nas próximas semanas, seguindo a ordem cronológica identificada em outros países.

"Os casos de Covid-19 começaram aqui depois de identificados nesses outros países. É uma situação que os médicos devem ficar alertas, porque isso pode acontecer também no Brasil e será daqui para frente que os casos deverão aparecer", explica.

A atenção dos médicos, especialmente os pediatras e intensivistas, tem sido redobrada, de acordo com Sandra Lange Zaponi Melek, médica pediatra intensivista, presidente do departamento de Terapia Intensiva e Emergências da Sociedade Paranaense de Pediatria (SPP).

"Estamos muito atentos a tudo, desde uma simples dor abdominal até uma manifestação mais grave. Ainda assim, eu cuidei de um caso, em fevereiro, de uma criança de 3 anos com a síndrome do choque tóxico. Na ocasião, não pensamos em Covid-19, nem foi testada para isso, porque não tinha a suspeita clínica. A criança tinha uma pneumonia grave, que foi tratada e hoje está bem", cita a médica, que também é chefe da UTI pediátrica e coordenadora da residência de Terapia Intensiva Pediátrica do Hospital Angelina Caron, além de fazer parte do corpo clínico da UTI geral do Hospital Pequeno Príncipe.

Sinais de alerta

Dos sinais que os pais devem ficar atentos, segundo explica a médica imunologista e pediatra Carolina Prando, estão:

  • Febre acima de 38,5 graus Celsius e persistente (mesmo com medicação, não reduz);
  • Dor abdominal;
  • Diarreia;
  • Vômito;
  • Dor de garganta;
  • Vermelhidão pelo corpo;
  • Mucosa da boca mais vermelha e mais sensível;
  • Inchaço de mãos e pés;
  • Dores de cabeça;
  • Conjuntivite;
  • Aumento das ínguas ou linfonodos pelo corpo.

"Essa seria a constelação dos sintomas, mas é preciso que os pais mantenham contato com o pediatra da criança, para que ele oriente a necessidade de ir ao pronto socorro ou não. É um quadro grave, mas nem sempre uma dor de garganta, sozinha, exige uma ida ao médico. Quem não tiver um pediatra, busque os serviços de teleatendimento", explica a médica.

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