O que são as escolas de pais e como elas contribuem com a missão de ser pai e mãe
| Foto: Anna Pritchard/Unsplash

Se você prefere reportagens em que a principal informação está no começo, fique com ela e repita-a como um mantra: não há problema nenhum em pais procurarem orientação sobre como educar os seus filhos. Seja partilhando experiências com outros pais, visitando um especialista ou lendo o nosso conteúdo aqui no Sempre Família, o fato é que as crianças não vêm com manual. Engajar-se sem reservas na missão de pai e de mãe, reconhecendo não saber tudo e procurando entender como colaborar da melhor forma no desenvolvimento dos filhos, é uma atitude da qual ninguém deveria se envergonhar.

Com diz o conhecido ditado africano, “é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança”. É com esse intuito de auxiliar os pais em sua missão que diversas iniciativas compartilham informações, orientações e reflexões sobre a parentalidade em todas as fases da vida da criança e do adolescente. Presencialmente ou à distância, especialistas se colocam à disposição para dar indicações em temas que vão de trocar as fraldas a desenvolver um relacionamento de confiança e diálogo com um filho adolescente.

No Brasil, um dos trabalhos mais antigos nesse campo é o da Escola de Pais do Brasil (EPB), que teve início em 1963, em São Paulo, espalhando-se ao longo dos anos por outros 12 estados e o Distrito Federal. Fundada por casais católicos, padres e freiras, a entidade desde o início foi pensada como um trabalho não confessional, voltado a todos os casais, independentemente da afiliação religiosa.

Sob a demanda de escolas, igrejas e outras organizações, a EPB oferece um percurso de sete encontros semanais chamado Círculo de Debates, em que dialoga com pais e mães sobre valores, limites e as particularidades de cada fase da educação dos filhos. Ao longo de quase 57 anos de atuação, mais de 200 mil pais e mães já participaram das atividades.

“O perfil das pessoas que participam é muito variado, mas o curioso é que os que se interessam, em sua maioria, são os que já estão preocupados com a educação dos filhos e têm uma caminhada de reflexão sobre isso”, conta Marlene de Fátima Merege Pereira, que com o marido José Carlos preside a seccional de Curitiba da EPB. “As entidades que nos convidam costumam ter dificuldade na formação dos grupos, pois muitos pais não sentem a necessidade do investimento na educação dos menores sob sua responsabilidade. Sabemos que não é fácil participar durante sete semanas de um trabalho interativo, com troca de experiências, e perceber o grande desafio de rever conceitos e comportamentos”.

Inspiração pessoal

Com a internet, é possível criar pontes antes impensáveis e superar a dificuldade de participação presencial de muitos pais. O Mundo em Cores, uma plataforma que oferece diversos cursos que giram em torno da educação dos filhos e do relacionamento do casal, já nasceu digital, em 2016. “Amamentação na prática”, “Turbinando a linguagem do bebê”, “O casamento depois dos filhos” e “Educando com disciplina positiva” são algumas das temáticas ofertadas.

“A gente acredita muito no potencial das crianças. O nosso papel é fazer com que os pais acreditem no potencial inimaginável que seus filhos têm de se desenvolver moral e intelectualmente”, conta o fundador da escola, Rodrigo Quintão, que criou o Mundo em Cores depois de refletir sobre a sua experiência pessoal.

“Fui uma criança com muitas dificuldades na escola e isso me incomodava bastante, porque eu sabia do meu potencial em outras áreas”, conta. “Minha irmã caçula tem síndrome de Down. Desde que ela nasceu, meus pais pesquisaram muito para saber o que era necessário para o desenvolvimento dela, para que ela tivesse uma vida normal, feliz e autônoma. Entre exercícios físicos, linguísticos, matemáticos e tudo o mais, minha mãe encontrou muitos recursos e hoje a minha irmã é superindependente. Cresci vendo todo esse trabalho sendo desenvolvido com a minha irmã, enquanto eu sofria com o dia a dia na escola”.

“Minhas sobrinhas passaram pelas mesmas dificuldades que vivi e então comecei a perceber que eu podia fazer algo para mudar essa realidade”, diz Rodrigo. “Olhei para o meu passado, liguei os pontos e me lembrei do trabalho dos meus pais com a minha irmã. Vi que tinha jeito de ajudar uma criança a se desenvolver e se preparar para o mundo”.

Compartilhando experiências

Os cursos presenciais, porém, permanecem firmes. A Igreja Batista do Bacacheri, em Curitiba, por exemplo, mantém a Escola de Pais, com seis turmas diferentes que abarcam da gestação à juventude – cada uma delas com a classe dos pais e a classe dos filhos. “O objetivo é preparar os filhos, além dos estudos, para as escolhas, decisões e enfrentamentos da vida e principalmente para saberem que sempre terão em seus pais um lugar de aceitação”, explica a pedagoga Valdeni Fontelli Falvo, coordenadora auxiliar do projeto.

“Para mim, a grande diferença que a Escola de Pais fez em nossa vida foi poder ser intencional na criação dos nossos filhos”, conta a empresária Karoline Koop Seifert, de 32 anos, que participa do projeto ao lado do marido – o engenheiro mecânico Fernando, de 34 – e dos filhos Gabriel, de 5 anos, e Noah, de 3. “Uma das coisas que mais nos agrada na Escola é a possibilidade de conhecer outras famílias que estão passando pelos mesmos desafios que nós. Compartilhar essas experiências é algo muito enriquecedor e que deixa a nossa forma de maternar e paternar muito mais leve, sabendo que podemos caminhar juntos”.

Já o Gesta Baby surgiu há três anos em Caxias do Sul (RS) como fruto da experiência da técnica de enfermagem Morgana Zago de Mello. “Na época eu trabalhava na maternidade do Hospital Saúde e via a necessidade e a insegurança dos pais de primeira viagem”, conta Morgana. “Eles queriam levar as enfermeiras para casa”.

Com a colaboração de duas colegas, Morgana planejou um curso de um dia só, com nove horas de duração e a participação de fisioterapeutas, nutricionistas, dentistas e outros profissionais. E não são apenas as gestantes que participam. “O curso é para o casal. Justamente para fazer os pais participarem”, conta Morgana. “E eles adoram – muitas vezes são eles que agendam o curso. Adoram o momento da prática onde são eles que dão banho nos bebês, fazem arrotar, trocam a fralda”.

Clube do Bolinha

A necessidade de integrar os paizões também foi sentida por Fernando Dias, que cinco anos atrás criou o Vou Ser Pai – E Agora?, um curso voltado apenas para os homens, que começou presencial em Belo Horizonte e hoje é uma plataforma digital. Enquanto Fernando aborda temas como finanças, relacionamento do casal e a participação dos avós, a enfermeira Vanessa Machado fala dos cuidados como troca de fralda e banho.

“É como se dois homens estivessem sentados num bar, tomando cerveja e eu contando: ‘Amigo, senta aqui que vou te contar como vai ficar sua vida daqui para a frente’”, explica Fernando. “A questão que mais enfatizamos é o relacionamento afetivo entre o pai e a criança. Bato muito na tecla que os pais sejam muito participativos desde a gravidez, para que criem vínculos e memórias afetivas, sem ser só ajudante de mãe ou pagador de conta”.

Para o representante comercial Willian Guimarães, de 36 anos, o curso fez toda a diferença. “Nunca tive muito contato com criança. Sempre que alguém me apresentava algum bebê, eu tinha receio de pegar no colo. Quando tive a notícia de que seria pai, decidi fazer algo para passar segurança à minha esposa e ter mais firmeza e tranquilidade”, conta ele, que é pai do Elias, de 3 anos. “Depois do curso, fiz questão de estar presente em todo momento, cansado ou não. Tenho tranquilidade para, por exemplo, viajar sozinho com meu filho, sem sentir aquela ‘falta’ da mãe, porque posso suprir as necessidades que em outras épocas eram atribuídas à mãe. Sou muito feliz por isso”.

Tanto o Gesta Baby quanto o Vou Ser Pai – E Agora? entram na categoria “programa ou atividade de orientação sobre paternidade responsável” de que fala a Lei 13.257/16. Segundo a legislação, os pais que são empregados de empresas inscritas no Programa Empresa Cidadã podem ter 20 dias de licença-paternidade em vez de 5, desde que comprovem participação em uma atividade desse tipo.

Deixe sua opinião