Enrico Simonato, codiretor adjunto do Museu do Sudário de Turim. Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo
Enrico Simonato, codiretor adjunto do Museu do Sudário de Turim. Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo| Foto:

Conservado em Turim, na Itália, o Santo Sudário é uma das relíquias mais instigantes da tradição cristã. Trata-se de um pano de linho em que se veem manchas de sangue e a imagem de um homem morto, de frente e de costas. Seria o próprio Jesus?

Estudos científicos já comprovaram que o Sudário, sem dúvida, envolveu um cadáver de um homem que foi flagelado, crucificado, coroado de espinhos e teve o peito aberto por uma lança. É altamente provável que esse homem tenha sido Jesus de Nazaré, já que não há registro de que outra pessoa tenha sofrido um suplício semelhante. Já a discussão sobre como a imagem se formou no pano permanece em aberto.

Para o químico Enrico Simonato, porém, é preciso não se obcecar com esse debate e dar mais atenção à mensagem que o Sudário transmite. Nascido em Turim e interessado pelo assunto desde a juventude, Simonato é secretário do Centro Internacional de Sindonologia e codiretor-adjunto do Museu do Sudário.

Ele esteve recentemente em Curitiba para a conferência de abertura da exposição Quem é o homem do Sudário?, que está aberta para visitação na Pontifícia Universidade Católica do Paraná até 3 de junho. Na ocasião, Simonato conversou com o Sempre Família sobre o significado do Sudário e o alcance de sua mensagem. Confira a entrevista abaixo e leia também a conversa que ele teve com o blog Tubo de Ensaio, da Gazeta do Povo, em que abordou os aspectos científicos do tema.

O senhor costuma dizer que, no meio do debate sobre a autenticidade do Sudário, perde-se de vista o principal, que é a sua mensagem. Em que consiste essa mensagem?

O Sudário evoca o conceito de que não temos um Deus que está no Olimpo, sobre as nuvens, cuidando das suas coisas, mas um Deus que desce sobre a terra e nos dá a mão, que está disponível para vir ao nosso encontro. O Deus dos cristãos é um Deus que está aqui, que se faz homem como nós, que come conosco, que passeia conosco, que sofre conosco. Nós nos sentimos próximos dele e temos efetivamente a sensação do que é ser filho de Deus.

Se o mais importante é a mensagem do Sudário, o que o diferencia de outras imagens e ícones?

Os ícones são, em geral, representações. O Sudário é uma imagem produzida por um cadáver. Não é a representação feita por um artista, ainda que inspirada, iluminada, cheia de significado. É uma paixão de Cristo capturada imediatamente. Não há a mediação, a interpretação do artista. Não que a mediação seja negativa, mas no Sudário nos relacionamos diretamente com a marca da imagem daquele homem. A mensagem é, portanto, diferente da de outro ícone, ainda que também esta possa ser altamente espiritual.

A exposição conta com uma réplica do Sudário em tamanho real, além de painéis expositivos e réplicas de objetos relacionados ao homem do Sudário. Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo A exposição conta com uma réplica do Sudário em tamanho real, além de painéis expositivos e réplicas de objetos relacionados ao homem do Sudário. Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

O senhor diria que o que atrai as pessoas a exposições como esta é o debate sobre a autenticidade do Sudário ou a mensagem que ele transmite?

Posso responder a partir da minha experiência em Turim, com as pessoas que visitam o Sudário, mesmo quando ele está dentro do seu relicário e não pode ser visto.  Muitas pessoas vêm por causa das questões técnicas e científicas, mas vão embora tocadas por uma mensagem pessoal. Durante as ostensões [as exposições públicas do Sudário], vejo muitos que chegam com uma expressão e vão embora com outra.

É grande o interesse de cristãos de outras denominações e fiéis de outras religiões no Santo Sudário?

Sim, porque a mensagem que ele transmite é uma mensagem universal. Já vi muitos muçulmanos e judeus visitando o Sudário. Claro, o muçulmano, por exemplo, diz que Jesus não é Deus e sim um grande profeta como Maomé e Abraão, mas a mensagem do sofrimento e da presença de Jesus no meio de nós atinge a todos. Eu diria que atualmente o grupo mais interessado em assuntos relacionados ao Sudário são, com certeza, os cristãos ortodoxos. Logo depois, a América Latina. Depois, a América do Norte, bastante dividida entre negacionistas e autenticistas. Já os europeus hoje são talvez os menos interessados.

Como o senhor avalia o debate em torno do Sudário hoje?

Falta serenidade. Ambos os lados do debate perderam um pouco de vista a mensagem do Sudário. Em nível popular, isso não acontece. Vêm milhões de peregrinos da Itália e do mundo todo quando se faz a ostensão. É mais um problema da intelligentsia cultural e científica. Na internet há coisas absurdas, desde aqueles que usam o Sudário como prova científica da ressurreição de Jesus até aqueles que negam a sua autenticidade por princípio. Há uma polarização do debate que carece de bom senso e de significado. É preciso reencontrar a serenidade e então será possível rediscutir, reescrever, reavaliar o debate. Quem nos ensina muito sobre o que deve ser a mensagem do Sudário são os doentes. Vê-los diante do Sudário nos faz entender muita coisa. Percebemos essa “com-paixão”, esse sofrer junto, esse sentir que não sou o único a sofrer. Ver os doentes diante do Sudário é uma experiência forte.

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Voltamos então, ao ponto de partida: compreende bem o Sudário quem compreende a sua mensagem.

O Sudário é uma testemunha concreta de que Deus se fez homem. Parece-me que mais importante do que o sofrimento, é entender, a partir da contemplação daquele sofrimento, que Deus está próximo de mim. Ou melhor, que eu posso estar próximo de Deus, o que é um pouquinho diferente. Veja, aquele homem que puseram no Sudário está morto. Podemos fazer todo tipo de discurso, mas o fato é que aquele lençol envolveu um cadáver. Se ele é o filho de Deus, significa que chegou a compartilhar conosco até mesmo a morte – que é o máximo que um Deus pode compartilhar com as suas criaturas. A encarnação me faz entender o quanto o ser humano é importante.

Reprodução dos flagelos utilizados pelos romanos para açoitar o homem do Sudário. Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo Reprodução dos flagelos utilizados pelos romanos para açoitar o homem do Sudário. Foto: Pedro Serápio/Gazeta do Povo

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