Descobrir sozinha a verdade sobre o Papai Noel é parte do seu crescimento e um sinal de que a criança está desenvolvendo habilidades de pensamento crítico
A ideia de acreditar sem ver é fundamental para o ser humano e permanece muito além do fim da crença em Papai Noel.| Foto: Unsplash

A maior parte das crianças conhece o Papai Noel como aquele homem bonachão vestido de vermelho que entrega presentes na noite de Natal. Mas a origem da lenda do Papai Noel pode ser traçada até centenas de anos atrás, na figura do bispo São Nicolau.

Narrativas populares contam que Nicolau doou a sua herança e viajava pelas cidades ajudando os pobres e os enfermos. Ele se tornou o protetor das crianças e era admirado pela sua bondade.

Ainda que a noção de um homem voando pelo mundo em um trenó puxado por renas voadoras seja humanamente impossível, a magia do Papai Noel é uma tradição que perdura por gerações. Para muitas famílias, incorporar esse elemento em suas festas de fim de ano gera experiências alegres e divertidas. Oferece a oportunidade para brincar juntos e compartilhar histórias, revivendo memórias de infância e fortalecendo a empatia, a bondade e a generosidade.

Acreditar no Papai Noel pode, além disso, beneficiar o desenvolvimento das crianças abrindo espaço à criatividade, à imaginação e ao brincar. Dentro desse contexto de desenvolvimento, existem maneiras apropriadas de lidar, com honestidade e sensibilidade, com as perguntas do seu filho sobre o bom velhinho.

A infância é mágica

Durante a infância, a imaginação ofusca a fronteira entre a fantasia e a realidade, tornando mais fácil que as crianças acreditem. A ideia de acreditar sem ver é fundamental para o ser humano e permanece muito além do fim da crença em Papai Noel. Nossos cérebros são projetados para ligar os pontos a fim de explicar por que as coisas acontecem e por que são do jeito que são.

A fantasia é uma parte normal e saudável do desenvolvimento da criança. A maioria delas começa a brincar de faz-de-conta ainda em seu segundo ano de vida. A quantidade de tempo que uma criança passa nesse tipo de brincadeira aumenta durante os anos pré-escolares e depois diminui entre os 5 e os 8 anos de idade. A crença das crianças em figuras fantasiosas como o Papai Noel parece ser mais forte entre os 3 e os 8 anos.

Por meio da imaginação, as crianças desenvolvem capacidades psicológicas e emocionais que as ajudarão a entender o mundo ao seu redor. A imaginação, o faz-de-conta e a fantasia aprimoram a capacidade da criança de manter o foco, pensar em situações hipotéticas, raciocinar, resolver problemas, desenvolver teorias sobre como as pessoas pensam, se relacionar socialmente, trabalhar cooperativamente, negociar e criar novas possibilidades, nova identidades e novos mundos.

Tradições de Natal

Em muitas famílias, se o Papai Noel fazia parte das celebrações natalinas da infância dos pais, então provavelmente ele vai ter o seu lugar no Natal dos filhos. A tradição do Papai Noel pode começar escrevendo cartas a ele e visitando-o nos shoppings. Depois, na noite de Natal, algumas famílias preparam alguns biscoitos para o bom velhinho – e cenouras para as renas.

Mais recentemente, algumas famílias incorporaram a ideia de rastrear a viagem do Papai Noel através de aplicativos. Enquanto alguns consideram esse tipo de recurso um distanciamento da simplicidade que caracteriza a tradição do Papai Noel, outros veem nessas expressões contemporâneas uma forma de manter viva a magia do Natal.

As tradições de família são importantes para as crianças. Elas fortalecem os laços familiares, fornecem um senso de pertença e criam memórias que duram a vida toda. E mais: as tradições familiares contam às crianças uma história sobre quem elas são e sobre qual a importância da família. Crianças que conhecem a história da sua família e participam de tradições como essas são tipicamente mais equilibradas e têm níveis melhores de confiança e autoestima.

Descobrindo a verdade

Há muitos benefícios em proteger a crença da criança no Papai Noel. Mas mentir sobre a sua existência não é legal. A maior parte das crianças têm uma reação positiva à descoberta de que ele não existe. Descobrir a verdade sobre o Papai Noel é parte do seu crescimento e um sinal de que a criança está desenvolvendo habilidades de pensamento crítico.

O psicólogo Jean Piaget, o pioneiro do desenvolvimento cognitivo, propôs que as crianças entram no estágio operatório concreto do pensamento entre os 4 e os 8 anos de idade. É uma fase marcada pelo questionamento.

As crianças se tornam céticas e usam a imaginação para descobrir coisas. Elas experimentam, avaliam evidências e fazem análises baseadas no raciocínio lógico. Um homem pode mesmo voar pelo mundo inteiro em uma só noite? As crianças estão aprendendo a pensar por si mesmas e usarão habilidades de pensamento crítico para solucionar o mistério do Papai Noel. Isso é apropriado ao seu desenvolvimento e constitui um aprendizado importante.

Rito de passagem

Quando a criança pergunta se o Papai Noel existe de verdade, é importante que os pais decidam se ela está pronta para abandonar a fantasia. Quando seu filho começa a fazer perguntas assim, deixe que ele encaminhe a conversa. Pergunte-lhe o que ele acha sobre isso. Isso vai dar a você algumas ideias sobre como reagir.

Você não vai querer mentir para ele. É importante que as crianças aprendam a confiar em seus pais. Esses relacionamentos que se dão bem cedo na vida delas são importantes para que elas desenvolvam conexões fortes que durarão a vida toda.

Mas pode ser que vocês decidam conversar com seu filho sobre a possibilidade de manter o Papai Noel nas festividades, preservando viva a tradição para além da primeira infância e desenvolvendo uma tradição familiar que colabora para a união entre vocês. Pode ser também que você se surpreenda ao souber que seu filho está fingindo que acredita há um bom tempo.

Compartilhar a história de São Nicolau e sublinhar o espírito de generosidade, altruísmo, bondade e gratidão que caracteriza as festividades natalinas pode ser útil na hora de reforçar ao seu filho o que nos une.

*Professoras de Estudos de Primeira Infância na Universidade de Guelph-Humber, no Canadá.

Tradução de Felipe Koller.

©2019 The Conversation. Publicado com permissão. Original em inglês.

Deixe sua opinião