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A Coreia do Sul é o país mais conectado do planeta; lá, é completamente normal que um estudante de ensino fundamental tenha o seu smartphone e a rede celular é tão boa que é possível assistir TV por streaming no metrô. O lado ruim: a Coreia do Sul está enfrentando um número crescente de nativos digitais que não sabem como viver uma vida analógica.

“O governo tem promovido a tecnologia da informação e esses tipos de dispositivos, então o governo ajudou a criar esse problema”, disse ao jornal Washington Post Shim Yong-chool, diretor do National Center for Youth Internet Addiction Treatment, que funciona perto de Muju, no centro do país. “Agora, o governo está tentando ajudar a resolver isso.”

De acordo com o jornal, pesquisas sugerem que cerca de 10% dos adolescentes sul-coreanos são viciados em internet. O governo tentou conter esse problema através de medidas como a “Lei Cinderela”, que proíbe o acesso depois da meia-noite para gamers abaixo de 16 anos, mas muitos encontraram formas de contornar isso.

Há também acampamentos que oferecerem cursos de três a quatro semanas que envolvem aulas de redução de estresse e uma gama de atividades que incluem escalada, caminhada e aulas de violão.

Viciados

Desde que chegou a um desses acampamentos, conta o Washington Post, o jovem Yoon Yong-won experimentou pesadelos frequentes. Ele um dos vários viciados em internet que passaram por uma avaliação e receberam um atestado de vício do governo.

Na reportagem, ele conta que o primeiro dia, quando chegou e teve que desligar os seus gadgets, foi um dia de desespero. “Eu pensei: ‘Meu futuro está na maior escuridão’”, diz ele. “Eu estou muito frustrado; me sinto como se fosse um refém.” Yoon foi parar no acampamento durante as férias de inverno devido ao que fez durante as férias de verão. Ele jogou no computador por pelo menos 14 horas por dia. Mesmo durante o calendário escolar, ele gastava mais de 12 horas por dia com jogos ou aplicativos de conversa.

Quase 5 mil adolescentes passaram pelo acampamento em 2015, o primeiro ano completo de funcionamento. Todos foram enviados por seus pais ou professores, e tiveram o vício em internet comprovado antes de chegar. Os questionários incluem afirmações como: “Eu minto sobre o número de horas que passo online” e “Eu acho mais divertido estar no meu celular do que estar com minha família e meus amigos”.

Avalia-se que a maioria dos adolescentes esteja na “zona de perigo”, quando têm obsessão pelo uso de internet – o que com frequência leva a faltar às aulas – e sofrem dificuldades em interagir com as pessoas no mundo offline. Muitos também se isolam ou sentem-se solitários, ou ainda mostram agressividade e impulsividade.

“Nós consideramos o vício em internet da mesma maneira que outros vícios como o alcoolismo”, diz Shim. A abstinência repentina não é fácil. Alguns adolescentes foram pegos com um celular extra no meio de seus pertences, enquanto outros arriscaram fugir do acampamento, caminhando ou pedindo carona até a cidade mais próxima, a quase cinco quilômetros de distância, na busca por uma lan house.

“Fui obrigado”

O texto do Washington Post revela que na parede das salas, estão os formulários que eles preencheram no primeiro dia. Como profissão desejada, o que mais se lê é “programador”, e à pergunta sobre por que eles estão ali, a maioria respondeu com variações de “fui obrigado”.

“A minha mãe me disse para vir, e eu nem mesmo ganhei nada em troca por isso”, diz Yoon Suk-ho, um adolescente de 14 anos de Daegu. Ele reconhece, entretanto, que pode estar precisando de ajuda.

“Eu estou meio que pensando que posso ter um problema com meu smartphone”, diz ele, acrescentando que usa ele para jogar o tempo todo. “Quando cheguei aqui e me tomaram o celular, pensei: ‘Como vou viver sem ele?’”

No último dia do curso, os participantes serão avaliados novamente. Depois disso, receberão visitas periódicas de orientadores que checarão se está tudo bem. Ainda não há como ter noção de taxas de reincidência, já que o acampamento é muito novo, diz o diretor.

Pelo menos enquanto estão ali, alguns meninos descobrem que poderiam viver sem tecnologia. “É melhor do que eu pensava”, diz Kim Sung-min, de 14 anos. “Em casa, eu só costumo jogar. Mas aqui, nós conversamos uns com os outros.”

 

Colaborou: Felipe Koller

Com informações de Washington Post

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