Buscar uma relação romântica pelo simples fato de estar em busca da felicidade pode ser uma grande armadilha.
Buscar uma relação romântica pelo simples fato de estar em busca da felicidade pode ser uma grande armadilha.| Foto: Unsplash/Stefan Spassov

Basta alguém contar que está solteiro, que amigos e familiares, quase que desesperadamente, se dispõem a ajudar tal pessoa na missão de encontrar o par perfeito. Começam a dar milhares de conselhos e até indicar outros amigos e amigas que podem ser “bons partidos”. Tudo isso, é claro, porque querem ver aquela pessoa feliz. Afinal, não dá para ser feliz solteiro, não é? Será que não mesmo?

Vista por algumas pessoas como aquela que “ficou para titia”, a empresária curitibana Gabriela Borges, de 32 anos, já se questionou muitas vezes se ela também estaria destinada à felicidade, uma vez que está solteira há alguns anos. “Percebia que aquele sonho de ter alguém ficava cada vez mais distante e me perguntava ‘quando vou ser feliz?’”, conta a empresária. Hoje ela percebe que aquela busca incansável por encontrar alguém para se relacionar e, consequentemente, a dura cobrança de si mesma, eram resultados de uma “vida ideal” imposta pela sociedade.

“Desde muito pequenas somos induzidas a pensar que uma mulher só pode ser feliz quando encontra seu homem ideal, casa-se e tem filhos”, afirma Gabriela. “Quando uma mulher está solteira, as pessoas perguntam ‘e aí, cadê o namoradinho?’, se você começa a namorar, a pergunta muda para ‘e aí, quando vai ser o casamento?’. E depois, você ainda escuta ‘quando vêm os filhos?’. Isso tudo é muito ruim”.

De acordo com a psicóloga Mariana Pieruccini, o fato de a concepção de felicidade estar tão fortemente ligada ao relacionamento romântico parece ser uma herança histórica, da época em que encontrar alguém possuía objetivos puramente pragmáticos, de manutenção financeira e construção de família. “Casar-se era o destino, especialmente para a sobrevivência”, lembra a psicóloga. “O amor romântico mudou um pouco as coisas, porque possibilitou escolher a quem amar. E ao se ter essa escolha, também se escolhe a quem não se quer amar”.

Ilusões

Mas então, por que ainda acreditamos que a ideia de encontrar alguém equivale a encontrar a felicidade? Para Mariana, esse é um ponto de vista duplamente ilusório. Primeiramente, pela própria noção de felicidade. “Tem-se a felicidade como um objeto permanente, alcançável e, de preferência, durável”, comenta. Em segundo lugar, ela questiona: “o que há no outro, nesse parceiro ou parceira, que supostamente é dessa união que se encontra o que se entende como felicidade? Parece que, no fim das contas, encontrar alguém fala de uma busca sobre o que não se tem”.

É por isso que costumamos ouvir que em um relacionamento ideal um precisa completar o outro, ser como “tampa” e “panela”, como se nossa integralidade dependesse de outra pessoa. “Isso aponta muito para como a sociedade, no geral, entende os relacionamentos, como se fossem uma busca incansável por não se ver sozinho. O que por si só é um dilema, porque a solidão faz parte da existência humana”, explica a psicóloga. Além disso, buscar uma relação romântica pelo simples fato de estar em busca da felicidade pode ser uma grande armadilha, afinal, lembra Mariana, “viver um relacionamento significa abrir-se para novas experiências, que não são exclusivamente boas”.

Amar e ser amado

Diante de tudo isso, solteiros e solteiras – por opção ou não – correm o risco de chegar a uma perigosa conclusão sobre si mesmos: “não fui feito para amar e ser amado”. Isso porque supõem que uma relação de amor deve ser, necessariamente, uma relação romântica, o que é um grande erro. “As relações amorosas são construídas e estabelecidas desde uma tenra idade, com familiares, cuidadores, amigos, etc”, explica a psicóloga. “O ser humano foi feito para se relacionar amorosamente, construindo distintos laços com grupos e pessoas”. Portanto, sim, todos nós, solteiros, namorados, noivos, casados ou viúvos fomos feitos para amar e sermos amados. Talvez a felicidade esteja, justamente, em aprender a aproveitar cada oportunidade de amar.

“Acho que com o tempo vamos aprendendo que a felicidade não depende de ter ou não alguém ao seu lado, nem mesmo existe felicidade o tempo todo”, reconhece Gabriela. “A gente vai aprendendo a conviver até mesmo com a sensação de solidão que muitas vezes bate. Acima de tudo, somos pessoas e cada coisa tem seu tempo para acontecer ou até não acontecer, e saber disso deixa tudo mais leve e tranquilo”.

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